ORDEM DOS ADVOGADOS
DO BRASIL
Coordenação
Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário Brasileiro – COASC
Ofício
nº 001/2014
Maceió, 05 de
abril de 2014.
À
sua excelência o senhor
Dr.
Thiago Rodrigues Pontes Bomfim
Presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil, Seccional Alagoas.
Assunto:
Apresentação de sugestões e análise dos relatórios de visitas ao sistema carcerário
alagoano
Senhor Presidente,
Após uma série de visitas
técnicas ao complexo carcerário alagoano e de ter participado de uma série de debates
sobre o sistema carcerário brasileiro, promovido pela Ordem dos Advogados do
Brasil durante o início do corrente ano na sede do Conselho Federal em
Brasília, junto a diversas entidades governamentais e não governamentais, valemo-nos
do presente expediente para apresentar os relatórios em anexo, bem como nossa
avaliação e sugestões para a busca por melhorias.
Antes de qualquer
coisa, em julho de 2012, representantes do Departamento Penitenciário Nacional
– DEPEN, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP e da
Secretaria de Direitos Humanos realizaram inspeção nas unidades que
percorremos, encontrando inúmeras irregularidades.[1]
Em nossas visitas
técnicas, tornamos a encontrar algumas das deficiências já relatadas nas
inspeções acima referenciadas, mas outras nos pareceram equacionadas, razão
pela qual iremos focar naquelas que têm prevalecido e que carecem de pronta
intervenção das autoridades competentes.
No entanto, não há,
frise-se, por aqui, o horrendo cenário encontrado atualmente em Pedrinhas[2],
no Estado do Maranhão, ou no Presídio Central de Porto Alegre[3],
no Rio Grande do Sul, o que não quer dizer que as atuais condições atendam às
regras determinadas pela Constituição Federal ou que não careçam de nossa
preocupação e atuação para evitar o agravamento da crise.
Ademais, cumpre
ressaltar ainda que a Comissão do Advogado Criminalista e Relações
Penitenciárias da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Alagoas, muito
nos ajudou, fornecendo subsídios para as análises das informações coletadas.
Assim, as sugestões
referidas alhures, por questões práticas, conforme se estabeleceu na discussão
em nível nacional, serão distribuídas basicamente em três eixos fundamentais: I – controle do fluxo de entrada; II –
controle do fluxo interno; III – controle do fluxo de saída.
Vale ainda ressaltar,
que tais sugestões, apesar de terem sido discutidas, em sua grande parte, com
vistas ao panorama nacional, estão devidamente adequadas às particularidades
locais, uma vez que percorri todas as unidades prisionais de Alagoas, inclusive
a unidade de internação de menores, sempre acompanhado de representantes da
Superintendência do Sistema Prisional.
I
–
CONTROLE DO FLUXO DE ENTRADA
Neste tópico, a
intenção é a de avaliar de que forma o ente responsável pela privação da
liberdade procede ao introduzir o sujeito no sistema carcerário e de que forma
lida com as pessoas que precisam circular pelas dependências das unidades
carcerárias.
1.1. Sistema de informações em tempo real
É a informação um dos
bens mais preciosos na formulação de políticas de segurança pública e de
execução penal. Trabalhar estratégias de prevenção e resolução de conflitos,
dentro ou fora do sistema carcerário, o mais próximo possível da realidade é
fundamental para alcançar os resultados desejados. Portanto, apesar de
apontarmos esse item dentro deste primeiro eixo, não custa lembrar que sua
importância abarca todos os demais.
Sobre este ponto, a Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e
Direitos Humanos do Paraná é modelo para o Brasil, com um sistema de
informações que possibilita de forma segura mensurar a população carcerária,
nominar os encarcerados, identificar as infrações que cometeram, dentre outras circunstância
tão importantes quanto.
Pelo que pudemos
constatar, apesar dos esforços de abnegados servidores com os quais nos
deparamos durante a série de visitas que fizemos no complexo prisional, há
séria deficiência a esse respeito.
Os computadores
armazenam as informações dos presos, mas, apesar dos sistemas que utilizam
(como “Alcatraz” e “SPIS”) não há articulação eficiente entre eles, nem com
sistemas de outros Estados, impossibilitando, dentre outras coisas, o
conhecimento rápido do funcionamento de todo o sistema alagoano em tempo real.
O controle do acesso ao
complexo prisional no bairro do Tabuleiro, na capital do Estado, bem como o
controle do acesso de pessoas nas unidades é precário e ainda calcado
basicamente na anotação em papel dos dados das pessoas que lá comparecem
durante a semana.
A unidade que mais se
aproxima do modelo ideal de coleta e controle das informações é o Presídio do
Agreste, apesar das deficiências que ainda possui, como, por exemplo, a
precariedade de articulação entre os gestores da referida unidade e os gestores
que ficam baseados na Capital.
Sugerimos,
além de procurar-se maior articulação das informações sobre o sistema, adotar,
o BI/SIGEP/BRASIL - Business Inteligence,
Sistema de Gestão da Execução Penal, instituído pelo Conselho
Nacional de Secretários de Estado da Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Prisional – CONSEJ, contando-se,
inclusive, para isso, com o apoio da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério
Público Federal, que servirá para gerenciar os dados dos presos e dos
estabelecimentos penais, atualizados diariamente, e por servidores
exclusivamente dedicados a isso, como ferramenta para:
a) diagnóstico de situação em estabelecimentos penais sobre
1) quem são os encarcerados, 2) onde estão recolhidos, 3) número, tipo e regime
de cumprimento de pena adotado nos estabelecimentos penais, 4) quais as
condições carcerárias, de forma e orientar Mutirões Jurídicos Temáticos;
b) diagnóstico de situação em carceragem de delegacias de polícia sobre
1) quem são, 2) onde estão recolhidos, 3) quais as condições carcerárias 4)
localização, de forma a orientar Mutirões Jurídicos Temáticos;
c) tomada de decisões de gestão sobre a)
classificação de presos; b) transferências, c) equilíbrio da população
carcerária; d) situação individual do cumprimento da pena; e) sobre necessidade
de ampliação, reforma e construção; f) medidas necessárias para
ressocialização; g) monitoração eletrônica.
d) integração interinstitucional (Judiciário,
Executivo, Advogados, Defensoria, Ministério Público, Conselho Penitenciário,
entre outros).
Vale frisar que, o
esquema acima traçado, pode ser também encontrado da carta conjunta feita entre
o Conselho Nacional de Secretários de Estado da
Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração
Prisional e a Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário – COASC.[4]
Dessa forma, sugerimos contato com a
secretária daquele Estado da federação, Maria Tereza Uille Gomes, que, em reunião em Brasília, em fevereiro
do corrente ano na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil,
disponibilizou o sistema para todos os Estados, inclusive se colocando à
disposição para troca de ideias a fim de que se implante em Alagoas a mesma
forma de gerir os dados relacionados ao sistema carcerário.
Por fim, urgem
providências a esse respeito, respeitando-se o princípio constitucional da
eficiência (art. 37), sobretudo diante da proposta de adoção da informatização
plena no sistema carcerário por parte do PLS 513/2013, tramitando no Senado da
República, que dispõe sobre a reforma da Lei de Execução Penal.
O controle das
informações do sistema carcerário, não apenas sobre os presos, mas sobre os
servidores também, com suas escalas, frequências, procedimentos pelos quais
respondam entre outras circunstâncias, é item dos mais importantes, merecendo e
precisando receber a atenção e pronta intervenção do Estado.
Nessa esteira, a
profissionalização do sistema de execução penal, que passa obrigatoriamente por
esse processo de informatização, é uma necessidade que se impõe.
1.2.
Carceragem em delegacias
Os presos em flagrante,
ou provenientes de prisões cautelares, conforme verificamos, tem se amontoado em
delegacias espalhadas pelo Estado, o que dificulta até mesmo mensurar com um
grau aceitável de segurança a população carcerária alagoana (o número é
certamente muito maior do que o que consta dos documentos dos órgãos oficiais),
além do fato de desvirtuar o trabalho de policiais civis, que acabam se
prestando ao papel de agentes penitenciários e não se dedicando como deveriam
ao seu papel constitucional, comprometendo-se assim, todo potencial de
efetividade do sistema penal.
Dessa forma, sugere-se acabar, a exemplo do
que já fez o Estado do Rio de Janeiro, com uma população carcerária muito maior
que a alagoana, com as carceragens em delegacia de polícias, fazendo com que
todas as pessoas que tenham sua liberdade privada pelo Estado passem
diretamente a integrar oficialmente o sistema carcerário.
É essa, inclusive, a
previsão do art. 204 do PLS 513/2013, sendo discutido atualmente no Senado da
República, que dá prazo de quatro anos para que os Estado acabem
definitivamente com as carceragens em delegacias.
Sugere-se
ainda que seja encaminhado expediente aos gestores do sistema carcerário
alagoano, solicitando que incluam como unidade prisional, no cálculo das
estatísticas especialmente, o Cadeião de Arapiraca, que atualmente, segundo as
informações que recolhemos, conta com mais de 100 presos.
1.3.
Separação
1.3.1.
Condenados X Provisórios
Como se sabe, nem todos
os ingressos no sistema carcerário provêm de sentença condenatória com trânsito
em julgado. Há aqueles, que em Alagoas, frise-se, ainda são a maioria, presos
provenientes de decretação de prisão cautelar.
Durante nossas visitas,
apesar de existirem unidades que deveriam se prestar a receber apenas
provisórios, identificamos que a regra instituída pelo art. 84 da Lei de
Execuções Penais, de separação de presos, não tem prevalecido.
Diante da falta de
espaços, por conta da superlotação, e do elevado número de presos provisórios,
é, na grande maioria dos casos, inviável a separação.
A prioridade dos
gestores das unidades prisionais superlotadas tem sido evitar conflitos entre
os presos, privilegiando-se assim, o convívio na hora de abriga-los no sistema.
Neste aspecto, importa
frisar, tais conflitos, que podem inclusive desaguar em rebeliões,
infelizmente, diante do cenário, não são mais permitidos ao Estado evitar. Aos
presos, a deflagração de rebeliões, aqui em Alagoas ou em qualquer oura unidade
da federação, na imensa maioria das unidades prisionais, não é mais uma questão
de oportunidade, mas de conveniência.
Como destacamos nos
relatórios em anexo, os presos recém-ingressos, condenados ou provisórios, são
colocados na triagem dos módulos onde serão “avaliados” pelos demais. Caso
nenhum dos “veteranos” se manifeste contra, o preso é inserido no módulo.
Nessa “avaliação”,
obviamente o pertencimento a facções também pesa, mas os gestores das unidades
prisionais procuram não destacar essa condição para que não se fortaleça alguma
espécie de “status” na população carcerária.
Sugere-se,
por oportuno, que sejam emitidas recomendações às gerências das unidades
prisionais para que, tanto quanto possível, na separação dos presos, seja
atendido com prioridade o critério da separação conforme estabelece a Lei de
Execuções Penais, especialmente em se tratando de acusados ou condenados por
crimes sexuais.
No mesmo sentido, sugere-se que seja encaminhado
expediente para o Presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas para que seja
formulada recomendação aos juízos criminais (dos processos de conhecimento e de
execução penal) do Estado no sentido de orientá-los a:
a) se articularem periodicamente
junto à Superintendência Penitenciária para que saibam, antes da decisão de
custódia cautelar, se há vagas para presos provisórios disponíveis no sistema e
em quais condições seria ele abrigado;
b) avaliarem como
prioridade, caso realmente haja necessidade de uma cautelar restritiva para a
preservação da persecução penal, a possibilidade de monitoramento eletrônico,
como substitutivo da prisão;
c) avaliarem, caso
realmente haja necessidade de uma cautelar restritiva para a preservação da
persecução penal, a possibilidade de prisão domiciliar, inclusive com
monitoramento eletrônico, como imperativo de respeito à dignidade humana.
1.3.2.
LGBT
A presença de pessoas
privadas de sua liberdade com orientação sexual que foge aos padrões ditados
pela maioria da sociedade, pelo que observamos e colhemos dos servidores nas
visitas, não é uma constância, mas, obviamente, existem.
Contando-se com essa
possibilidade, aliado ao estigma que os acompanham numa sociedade ainda muito
preconceituosa, aos que tem a coragem de se declarar ou apresentam sinais
visíveis dessa opção sexual, segundo as informações dos servidores do sistema,
há uma preocupação com a separação, mas existem módulos que aceitam sem
problemas a presença deles no seu convívio, conforme fizemos constar nos
relatórios em anexo.
Vale destacar ainda
que, no Presídio Baldomero Cavalcante, fomos informados de que dias antes havia
ocorrido a oficialização de uma união homoafetiva entre dois presos, conforme
descrevemos nos relatórios anexos, o que de certa forma demonstra que há por
parte dos gestores das unidades uma preocupação com a dignidade sexual desses
presos.
1.3.2.
Crimes sexuais
Como constatamos,
atualmente alguns acusados e condenados por crimes sexuais são abrigados no
sistema, que, segundo os gestores das unidades prisionais, são separados dos
demais.
Apesar disto, há
módulos que aceitam a presença dessas pessoas sem problemas, como é, em geral,
o caso dos módulos constituídos de presos que trabalham.
1.3.3.
Tipos de infração
Tal como no caso do
item 1.3.1. a separação pelo tipo de infração não tem sido prioridade e,
portanto, dificilmente é feita, o que se constitui como grave violação das
disposições da Lei de Execuções Penais, razão pela qual adotamos aqui as mesmas
considerações já feitas alhures.
1.3.4.
Facções
Constatamos nas
unidades integrantes do Primeiro Comando da Capital – PCC, da Firma,
organização genuinamente alagoana, tida como uma espécie de prestadora de
serviços da primeira, e do Comando Vermelho.
Apesar de não fazerem
referências às facções no trato com os presos, para que não se fomente certo
“status”, há uma preocupação dos gestores do sistema para que não sejam gerados
conflitos entre essas organizações criminosas quando misturados seus
integrantes.
Como se verifica dos
relatórios acostados, os presos “novatos” ficam um período de “aclimatação”
junto aos módulos que se pretende coloca-los, no caso do Cyridião Durval, por
exemplo, num espécie de triagem anexa ao módulo. Se nenhum dos “veteranos” do
módulo se opuser durante esse período, o “novato” é introduzido no módulo.
1.3.5.
Deficientes físicos
Encontramos apenas um
preso portador de deficiência física durante as visitas técnicas, na casa de
custódia, usuário de cadeira de rodas. Segundo apuramos com os gestores das unidades,
a presença de pessoas com deficiência não é comum, mas há preocupação com adaptações
para que possam exercer os mesmos direitos e cumprir os mesmos deveres que os
demais.
Na prática, só vimos
uma unidade com preocupação explícita nesse sentido, o Núcleo de Ressocialização,
inclusive com banheiro adaptado para portadores de necessidades especiais.
Nesse sentido, sugere-se que sejam encaminhados
ofícios às entidades que cuidam diretamente dos interesses dos portadores de
deficiência física para que se articulem, junto com a Ordem dos Advogados do
Brasil, e com os gestores do sistema carcerário a fim de fazerem levantamento
de presos com deficiência física e elaborar conjuntamente uma política estadual
de atendimento das demandas que um preso nessas condições requer quando
ingresso.
1.3.6.
Idosos e pacientes do Centro Psiquiátrico
Não nos deparamos com
muitos presos idosos, a grande maioria é composta por jovens e adultos. Sugere-se que seja encaminhado
expediente aos gestores das unidades prisionais para que observem as
necessidades especiais que são impostas diante de presos com mais de 60 anos.
Percebemos durante as
visitas, presos com idade avançada no Centro Psiquiátrico, onde se encontram
pacientes com mais de 30 (trinta) anos na unidade, o que nos parece grave
violação de preceito constitucional e legal.
A esse respeito sugere-se que sejam encaminhados
expedientes às autoridades competentes para que realizem as modificações que
atendem ao pleito antigo de movimentos antimanicomiais, já reconhecidos na Lei
10.216/2001, na Portaria nº 94/2014 do Ministério da Saúde, e na Portaria
Interministerial MJ/MS nº 01/2014.
1.3.7.
Estrangeiros
Durante nossas visitas só
nos deparamos com um preso estrangeiro, de origem Tcheca, no módulo denominado
de “cristão”, do Presídio Cyrirdião Durval, conforme descrevemos nos relatórios
anexos.
O problema, nesses
casos, não apenas em Alagoas[5], é
a deficiência na comunicação com o preso, como pudemos constatar.
Sugere-se
que seja encaminhado expediente aos gestores do sistema carcerário, tanto local
quanto nacional, estimulando a articulação para que mantenham um núcleo com
servidores capazes de falar basicamente inglês e espanhol, além de se dedicar,
nos casos em que houver necessidade, a firmar convênio com instituições de
ensino de outras línguas.
1.4.
Revistas
Um dos principais focos
de tensão entre familiares dos presos e os gestores do sistema carcerário é a
revista manual, mais precisamente a forma degradante como ela é levada a cabo.
A prática da revista
manual é generalizada nas unidades prisionais de Alagoas, sobretudo diante da
falta de equipamentos de segurança, conforme descreveremos mais detalhadamente no
item 1.6.
Preocupa-nos essas
práticas, de maneira especial a revista manual em crianças e a possibilidade
delas presenciarem as revistas manuais realizadas nos familiares. Segundo todos
os servidores com os quais conversamos, as revistas em crianças são feitas na
presença dos responsáveis.
É imprescindível que os
gestores do sistema carcerário façam coro junto ao Departamento Penitenciário
Nacional – DEPEN, tal como sugerido abaixo (item 1.6), com vistas a adquirir equipamentos,
tais como scanners e detectores, que extingam as formas de revistas manuais utilizadas
hoje. E, caso realmente haja a necessidade de revista manual, que esta seja
feita, de forma sempre respeitosa, no preso.
Sugere-se,
portanto, encaminhe-se expediente ao conselho tutelar da região das unidades
prisionais, solicitando que em dias de visitas haja sempre um conselheiro para
acompanhar as revistas em crianças e adolescentes, quando estritamente
necessárias, evitando-se notícias de eventuais abusos.
Sugere-se
que sejam ainda encaminhados expedientes aos gestores do sistema carcerário orientando
que as crianças ou adolescentes não sejam levadas a presenciar as revistas
manuais que eventualmente precisem ser feitas em seus familiares.
Por fim, sugere-se que se encaminhe expediente
aos gestores do sistema carcerário alagoano reforçando a necessidade de se
respeitar a Resolução nº 09/2006[6]
emitida pelo Conselho Nacional de Políticas Criminais e Penitenciárias – CNPCP,
que disciplina as revistas, deixando-se as revistas manuais para casos extremos.
Sugere-se,
por fim, que seja encaminhado expediente para os gestores do sistema carcerário
orientando-os a adoção do sistema de agendamento de visitas pela internet,
dando mais celeridade ao processo de verificação de identidade em dias de
visita.
Prefira-se, desta
forma, como já frisamos, a revista aos presos após as visitas, ao invés de
revistas degradantes às famílias (e aos próprios funcionários), que, muitas
vezes, acabam se afastando do estabelecimento penal, portanto, do preso, por
medo ou vergonha do tratamento que podem receber antes de vê-lo.
Como se sabe, no
processo de ressocialização, a sensação de pertencimento à família, e a
participação da mesma é de extrema importância para o preso, não podendo o
Estado permitir que, com seu comportamento, haja o seu afastamento.
1.5.
Parlatórios
É imprescindível o
contato do preso com seu defensor (art. 5º, inciso LXIII, da CF/88). O advogado
é indispensável à administração da justiça (art. 133 da CF/88). O processo não
se finda com o trânsito em julgado da condenação criminal, mas tem seu curso
durante a execução penal, como já afirmava Francesco Carnelutti, em “As
misérias do processo penal”.
Mas para isso, é
preciso que ambos (preso e seu defensor técnico) tenham condições de conversar
sem barreiras tais como os vidros ou grades que geralmente separam advogado e
cliente nos parlatórios do sistema carcerário alagoano.
O desenho atual dos
parlatórios acaba impossibilitando, inclusive, que o defensor avalie até mesmo
as condições físicas de seu cliente, sobretudo naqueles cuja iluminação é
precária, como é o caso do que encontramos nos Presídios Cyridião Durval e Baldomero
Cavalcante.
Sugere-se,
portanto, que seja encaminhado
expediente aos gestores das unidades para que o atendimento jurídico aos presos
seja realizado nas salas para advogados mantidas pela Ordem em cada unidade
prisional.
Assim, como forma de
garantir dois itens importantes, a segurança e a privacidade, sugere-se que seja adotado o
modelo que encontramos no Presídio Feminino Santa Luzia, cuja porta de vidro
permitia as duas coisas.
Sugere-se ainda que a
Ordem faça um levantamento periódico, por intermédio de comissão específica,
das deficiências atualmente existentes nas referidas salas para advogados,
tornando-as ambientes sempre dignos do exercício da profissão.
Por fim, sugere-se que seja feito contato
institucional com a Superintendência Penitenciária para que seja
disponibilizada uma sala para advogados no Presídio do Agreste.
1.6.
Segurança
Detectamos deficiência
quanto ao controle do fluxo de pessoas no interior das unidades.
A precariedade da
estrutura, aliada à falta de servidores suficientes para dar conta da demanda
diante da superlotação, são os principais ingredientes que levam à fragilidade
da segurança, tanto dos presos quanto dos servidores.
Primeiro que, conforme
já dissemos alhures, o controle do fluxo de pessoas é basicamente feito de
forma manual, com anotações em papeis, com a exceção do Presídio do Agreste, dificultando
a articulação de informações e a detecção de pessoas que não poderiam nem
deveriam ter acesso às unidades.
Segundo que, existem
unidades que sequer contam com bloqueadores de sinal para celulares ou
similares, portais detectores de metal, scanners, raio-x ou até mesmo câmeras
de vigilância.
Nesse particular, a unidade
que se apresenta em piores condições é o Presídio de Segurança Máxima, conforme
descrevemos nos relatórios anexos, inaugurado há cerca de dois anos, atualmente
conta apenas com detectores de metal portáteis. A máquina de raio-x, os
bloqueadores de sinal de celular e os portais detectores, no momento de nossa
visita, estavam danificados.
Sugere-se,
que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades, bem como ao
Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, cobrando a articulação entre eles para
que, com recursos do Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN, seja realizado
processo licitatório com a finalidade de adquirir todos os equipamentos
necessários para suprir a deficiência atualmente existente em termos de
segurança, problema que acaba colocando em risco, especialmente os servidores que
operam o sistema.
Sugere-se
ainda que se recomende a contratação, também com os recursos do Fundo
Penitenciário Nacional – FUNPEN, mediante convênio com o órgão já indicado
acima, uma empresa especializada na manutenção e conserto dos referidos
equipamentos, para que não haja por longo período a interrupção do
funcionamento dos imprescindíveis serviços.
Ademais disso, sugere-se ainda que se recomende
aos gestores das unidades que, no trato com os presos no interior das unidades,
utilizem-se armamentos não letais, como hoje ocorre no Presídio do Agreste, que
deverão ser adquiridos da mesma forma que os demais equipamentos de segurança.
Ainda na esteira da
preocupação com a segurança, não apenas dos presos, mas também dos servidores,
cumpre-nos destacar que é imperioso que o Estado faça valer as disposições da
Lei 11.900/2009, que prevê a possibilidade de realização de interrogatório e
outros atos processuais por sistema de videoconferência.
Além de possibilitar
maior segurança, é menos custoso aos cofres públicos, que deixará de mobilizar
todo o aparato de servidores no deslocamento do preso.
Sendo assim, sugere-se que sejam encaminhados
expedientes ao Presidente de Tribunal de Justiça e aos gestores das unidades prisionais
para que se articulem no sentido de, junto ao Departamento Penitenciário
Nacional – DEPEN, com recursos do Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN,
adquiram toda a estrutura necessária para a instalação de um centro de
videoconferência no complexo prisional da Capital, bem como no Presídio do
Agreste e no fórum da Capital, onde a demanda é maior.
1.7.
Servidores
É urgente a necessidade
de realização de concurso público para suprir as deficiências atualmente
encontradas, assim como também é urgente a implantação de um plano de cargos e
salários. Não bastasse a quantidade insuficiente de servidores disponíveis,
especialmente agentes, alguns dos que exercem seus cargos deixam de comparecer
a seus postos por inúmeras razões: doenças e faltas injustificadas têm sido as
mais comuns, segundo apuramos nas visitas.
Sendo assim, sugere-se que seja encaminhado
expediente aos gestores do sistema carcerário para que: deflagre-se com a
máxima urgência processo seletivo para suprir a necessidade existente; apure-se
com celeridade e rigor as faltas injustificadas de servidores no sistema;
elaborem-se e executem-se políticas de valorização (o plano de cargos e
salários já seria um passo) e capacitação permanentemente dos servidores,
inclusive com suporte médico e psicológico.
II
– CONTROLE DO FLUXO INTERNO
Neste tópico, a
intenção é a de avaliar de que forma o ente responsável pela privação da
liberdade procede no trato com o sujeito no interior do sistema carcerário. O
trato com o encarcerado no interior do sistema é elemento de extrema
importância para dissipar as tensões naturalmente surgidas com esse tipo de
interferência na liberdade alheia.
Proporcionar, portanto,
vias que, além de atender aos requisitos legais e constitucionais, servirão
como “válvulas de escape” para os presos é de fundamental importância para o
regular funcionamento do sistema.
2.1.
Inspeções
Tal como previsto
atualmente na Lei de Execuções Penais as visitas de autoridades dos órgãos de
execução penal ao sistema carcerário são realizadas de forma separada, ou seja,
cada uma faz a sua de forma independente.
Segundo as informações
que tivemos de servidores, são constantes as presenças do juiz das execuções
penais, bem como a do representante do Ministério Público no sistema
carcerário, mas o Conselho da Comunidade e a Defensoria Pública apresentam
deficiência nesse particular, segundo constatamos nas visitas, especialmente no
complexo prisional da Capital.
Apesar de em nenhuma
das visitas nas unidades termos nos deparado com Defensor Público, é preciso
reconhecer que a Superintendência Penitenciária tem advogados contratados para
dar assistência aos presos, conforme observamos.
O Conselho da
Comunidade não é presença constante, segundo um de seus membros com quem
conversamos, a falta de recursos é um dos fatores que não permite um trabalho
mais eficiente junto ao sistema carcerário.
A Defensoria Pública, importante
órgão no acompanhamento dos processos de presos sem advogados, como dissemos,
também não tem constância nas unidades prisionais, com a exceção do Presídio do
Agreste, desvirtuando os ditames do art. 16 da Lei de Execução Penal.
As inspeções ao sistema
precisam ser feitas em conjunto com todos os representantes dos órgãos
parceiros do sistema de execução penal. A iniciativa evita que autoridades dos
órgãos hoje competentes pela fiscalização não procedam como deveriam, ou seja,
a pretexto de fazer suas inspeções restrinjam-se apenas a uma visita de
“cortesia” às dependências da administração das unidades prisionais, sem que
tenham verificado as condições das celas e demais dependências da unidade.
Assim sendo, sugere-se que seja encaminhado
expediente a todos os órgãos da execução penal, inclusive aos órgãos parceiros,
tais como a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados
– APAC, a Ordem dos Advogados do Brasil, a pastoral carcerária e os conselhos
da comunidade e penitenciário, para que se articulem no sentido de promoverem
um calendário de visitas periódicas e conjuntas no sistema carcerário alagoano.
Sugere-se
ainda que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades prisionais
estimulando-os a estabelecerem parcerias com instituições de ensino,
organizando um calendário de visitas ao sistema, com a intenção de
desmistificar o rótulo de presidiário, estimular o debate e o senso crítico
sobre o sistema carcerário, aproximando a sociedade da busca por soluções desse
grave problema, além de proporcionar vigilância constante de seu funcionamento.
Sugere-se que seja
encaminhado expediente ao Governo do Estado orientando-o a dotar o Conselho da
Comunidade de recursos mínimos para o seu pleno funcionamento.
2.2.
Trabalho
Como parte de uma
limitação constitucional pétrea, nosso país não adota pena de morte, salvo uma
única exceção (art. 5º, inciso XLVII, alínea “a”, da
Constituição Federal), nem pena de caráter perpétuo (art. 5º, inciso XLVII, alínea “b”, da Constituição Federal).
Sendo assim,
trabalha-se no sistema carcerário com a certeza de que o preso voltará às ruas.
Para que todo o dinheiro gasto com o encarcerado durante sua estadia nas
dependências do sistema não seja em vão, é preciso dotá-lo de capacidade para
superar o preconceito e as exigências do mercado de trabalho.
Nessa esteira, o
trabalho oferecido ao preso, além de sua utilidade como forma de remição, deve
ser útil fora das unidades prisionais, que não apenas sirvam como atividade
para retirá-lo do ócio, que também tem sua importância para o funcionamento do
sistema, mas não devendo se resumir a isso.
Constatamos que
inúmeros presos aguardam para trabalhar e ter a oportunidade de ver sua pena
remida, como prevê a Lei de Execução Penal (art. 126).
Não há, portanto,
trabalho para todos, havendo lista de espera para gozar desse benefício.
A única unidade que
conta com a possibilidade de trabalho para todos os presos que abriga é o
Núcleo de Ressocialização, cujo modelo, sugere-se,
precisa ser expandido.
Assim sendo, sugere-se que sejam encaminhados
expedientes aos gestores das unidades prisionais estimulando-os a fazerem,
junto com a Ordem dos Advogados do Brasil, coro junto ao Departamento
Penitenciário Nacional – DEPEN, com vistas a oferecerem a estrutura necessária
para ampliar a capacidade de geração de vagas de trabalho para a população
carcerária alagoana.
Sugere-se
ainda que o mesmo expediente solicite ao órgão federal que observe as
particularidades regionais do sistema antes de emitirem regras que servirão
para todo o país, especialmente para a utilização de programas como, por
exemplo, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e
Emprego – PRONATEC.
2.3.
Educação
A pedra de toque do
desenvolvimento, em todos os sentidos, é a educação. Capacitar as pessoas é
item fundamental em todos os países que alcançaram níveis respeitáveis de
desenvolvimento no mundo. E aos encarcerados essa preocupação não pode faltar,
sobretudo porque a eles se apresenta uma dificuldade ainda maior de competir no
mercado de trabalho: o preconceito.
É preciso, pois,
portanto, sugere-se, encaminhar
expediente aos gestores das unidades prisionais e da educação estadual e
municipal, bem como a entidades que fomentam o ensino profissionalizante, estimulando-os
a criarem uma estrutura fixa e de qualidade, além de uma carreira específica
para professores dentro do sistema carcerário.
Estimular o estudo é
importante não apenas pelo fato de servir como remição da pena, mas como
instrumento de transformação pessoal e social.
Sugere-se
ainda que, estes mesmos órgãos, trabalhem na elaboração de um Plano de Metas para
Educação Prisional, visando erradicar, até 2018, o número de presos não
alfabetizados no sistema carcerário.
Sugere-se que seja
encaminhado ao juízo das execuções penais, expediente no sentido de solicitar
que sejam admitidas diferentes formas de remição pelo estudo, inclusive a
leitura, conforme Recomendação nº 44/2013 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.
Sugere-se,
ainda, que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades prisionais
para que procurem parcerias com instituições de ensino à distância,
estimulando-as à responsabilidade social.
Assim, espera-se que
seja instituído o Programa de Remição da Pena pela Leitura em todos os
estabelecimentos penais, mediante, se preciso, aprovação de lei estadual.
Sugere-se,
por fim, que os gestores das unidades prisionais estimulem os presos a
participarem de processos democráticos, tal como na escolha do representante do
módulo, assim como hoje ocorre no Núcleo de Ressocialização, conforme relatamos
nos relatórios anexos.
2.4.
Saúde
Zelar pela saúde e
observar os direitos de tratamento físico e psicológico dos presos deve figurar
como uma das prioridades.
Aqui também há
necessidade de trazer o Sistema Único de Saúde – SUS para dentro do sistema
carcerário. Atualmente, os profissionais da saúde que trabalham no sistema
carcerário alagoano são contratados pela Superintendência Penitenciária, com a
exceção do Presídio do Agreste, cujos profissionais estão vinculados à empresa
que gere a unidade.
Os espaços para que os
profissionais atuem nas unidades, de modo geral, estão em bom estado de
conservação, alguns, inclusive, climatizados, e não ouvimos reclamações com
relação ao estoque de medicamentos.
No Núcleo de
Ressocialização, destaque-se, a sala da saúde não deixa a desejar a qualquer
sala de consultório particular da Capital.
Nas unidades existem
salas para o atendimento de dentistas, encontrada deficiência apenas na Cadeia
Pública, cujo condicionador de ar estava quebrado. Os principais serviços
oferecidos são extração e obturação.
Há ainda preocupação
com a presença de doenças como AIDS, tuberculose, diabetes, hipertensão, entre
outras, inclusive doenças de pele. Nas visitas encontramos presos fazendo
testes rápidos para a detecção de algumas dessas doenças e sendo vacinados
contra hepatite e outras doenças, como consta nos relatórios em anexo.
A esse respeito, sugere-se que seja encaminhado
expediente para os gestores da saúde estadual e municipal estimulando-os a criar
carreiras específicas para todos os profissionais da saúde no sistema
carcerário, especialmente médicos, atendendo-se, assim, a Política Nacional de
Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional
(PNAISP).
Sugere-se
ainda que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades prisionais
orientando-os a: seguir o manual do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN
de intervenções ambientais para o controle da tuberculose nas prisões[7];
promover medidas preventivas contra a transmissão do vírus da AIDS, inclusive
com a distribuição de camisinhas durante as visitas íntimas; intensificar a
realização de exames para detecção e tratamento de doenças infectocontagiosas.
Sugere-se
ainda que seja encaminhado expediente ao Presidente do Tribunal de Justiça do
Estado para que oriente os juízos criminais a observarem, antes de promoverem
transferências de presos entre as unidades, se os mesmos se encontram em
processo de tratamento de doenças como a AIDS e a tuberculose, cuja interrupção
do tratamento pode gerar grave prejuízo à saúde do preso.
Faz-se necessário,
pois, encare-se como uma sugestão,
com vistas a dar mais efetividade no tratamento, transferir imediatamente a
gestão do manicômio judicial para a Saúde, na forma determinada pela Portaria
nº 94, de 14.01.2014, do Ministro da Saúde, pela Portaria Interinstitucional
MJ/MS nº 01/2014 e da Lei nº 10.216, de 06.04.2001 (Lei Antimanicomial – Lei nº
10.216, de 06 de abril de 2001).
2.5.
Lazer
Atividades recreativas
tais como musculação, futebol, xadrez, música, e até mesmo o artesanato, entre
outras, devem se inserir nas estratégias de controle do fluxo interno do
sistema. É, pois, importante “válvula de escape” para as angústias a que são
submetidos aqueles que se submetem ao sistema carcerário.
Em nossas visitas,
vimos que poucas unidades possuem espaço adequado para a prática de esportes, e
as que possuem, dada a superlotação e a carência de servidores para acompanhar
as atividades, não é utilizada a contento.
As únicas unidades que
possuem espaço adequado, e dele se utilizam com constância, é o Núcleo de
Ressocialização e o Presídio do Agreste, que contam com a organização de
torneios entre os presos.
2.6.
Controle de progressão, remição e outras circunstâncias do cumprimento da pena
ou prisão provisória
Conforme já dissemos, o
sistema de acompanhamento dos dados do preso no sistema apresenta deficiências,
o que pode ser sanado com o atendimento das sugestões já feitas no item 1.1. O
domínio de tais informações perpassam as três estruturas que nos servem de
parâmetro para a confecção do presente relatório.
2.7.
Visita íntima
De notada influência no
comportamento humano, a atividade sexual é item que não pode ser negligenciado
pelas autoridades gestoras do sistema carcerário. Assim, é preciso proporcionar
ao encarcerado a oportunidade de encontros íntimos e reservados com seus
parceiros (as), ajudando na preservação da identidade familiar.
O direito à livre
atividade sexual é uma necessidade humana, e como todo direito, evidentemente,
precisa ser regrado, mas jamais vedado, sob pena de gerar tensões
desnecessárias e danosas ao bom funcionamento do sistema.
A situação é mais
crítica, conforme verificamos, na Cadeia Pública e no Baldomero Cavalcante,
onde geralmente o sistema utilizado é o do “come quieto”, ou seja, presos em
atividades sexuais com suas parceiras são separados de outros casais geralmente
por um lençol.
2.8.
Alimentação
Uma das necessidades
reais e imprescindíveis do ser humano é a alimentação. O direito à satisfação
da fome, ao acesso e utilização dos recursos naturais, a uma alimentação
saudável, assegurar condições aceitáveis de nutrição é dever inegociável do
Estado sobre os encarcerados.
Como se sabe, o
metabolismo tem influência direta no bem estar do corpo que, carente dos
nutrientes indispensáveis para o seu regular funcionamento e desenvolvimento,
acaba gerando reações indesejadas para o próprio sistema, com tensões que podem
desaguar em conflitos sérios.
Nesse particular
verificamos deficiência, ora na estrutura ora nos alimentos, apesar de
encontrarmos nutricionista à disposição.
Na cozinha da Cadeia
Pública, por exemplo, o teto sob as panelas se apresentava bastante
deteriorado, mas não ouvimos reclamações sobre a comida.
Já no Cyridião Durval,
no Baldomero Cavalcanti e no Presídio de Segurança Máxima, servidos pela mesma
cozinha, situada na primeira unidade, cuja estrutura se apresentava em
condições regulares, ouvimos reclamação sobre a comida.
Sugere-se
sejam encaminhados expedientes à vigilância sanitária para que sua presença
dentro do sistema carcerário seja uma constante, sobretudo nas cozinhas que
funcionam no local, apontando o que pode ser feito para melhorar a qualidade da
comida que serve tanto os presos quanto os servidores.
Sobre este aspecto, é
preciso ainda que se registre que o controle de acesso às cozinhas é
deficiente, com exceção do Presídio do Agreste, conforme fizemos constar do
relatório em anexo, com a participação de presos no preparo dos alimentos.
Há, portanto, que se
tratar de forma mais rígida o acesso à cozinha, tendo em vista que podem tanto
os presos quanto os funcionários ser vítimas de sabotagem, com graves
consequências à saúde.
2.9.
Liberdade de crença
Proporcionar espaços
para a reflexão e integração religiosa é dever do Estado e item fundamental na
tarefa de evitar ao máximo o surgimento de tensões danosas ao regular
funcionamento do sistema.
Nas unidades são
permitidas a realização de cerimônias religiosas e, segundo constatamos, a
presença mais constante nas unidades é de líderes de igrejas evangélicas.
III
– CONTROLE DO FLUXO DE SAÍDA
Neste tópico, a
intenção é a de avaliar de que forma o ente responsável pela privação da
liberdade procede para que o sujeito saia do sistema carcerário.
3.1.
Mutirões automáticos e temáticos
Sugere-se,
portanto, diante do quadro de superlotação já existente, a realização de
Mutirões Jurídicos Temáticos, com metodologia uniforme, e calendário a ser
discutido e aprovado pelos órgãos da execução penal, destacando-se: presos
provisórios, mulheres, presos por crimes não violentos,
dependente/microtraficante com pequena quantidade de droga, idosos e
estrangeiros, portadores de doença mental ou de doença contagiosa.
Uma vez equacionado o
problema, a ideia, já acolhida pela proposta de reforma da Lei de Execução
Penal (PLS 513/2013), é a de que se realizem mutirões automaticamente, assim
que a capacidade do estabelecimento penal for superada.
3.3.
Estímulo para a utilização do monitoramento eletrônico
Tal instrumento já vem
sendo utilizado nos Estados Unidos desde a década de 80. Diante do quadro de
superlotação, da demanda sempre constante por mais vagas, e, principalmente, da
inexistência de regime semiaberto, nos moldes do determinado pela Lei de
Execução Penal, a busca por alternativas à privação da liberdade no sistema
carcerário é uma necessidade.
Nesse sentido, o
monitoramento eletrônico é uma alternativa, sobretudo se, caso necessário,
aliado à prisão domiciliar. A esse respeito, já fizemos sugestão no item 1.1.
3.4.
Documentos para os presos
Providenciar os
documentos de cidadania para todos os presos é uma obrigação do Estado que
tutela sob sua responsabilidade a liberdade alheia.
No sistema carcerário
alagoano há, no complexo prisional localizado na Capital, um balcão cidadão,
que tem por finalidade auxiliar os gestores das unidades prisionais na busca da
documentação dos presos.
É imperioso, portanto,
intensificar a política de expedição de documentos de cidadania: número único
da certidão de nascimento, RG, CPF, Carteira de Trabalho e Título de Eleitor,
articulando com cada Órgão competente na União ou nos Estados a emissão destes
documentos (Gestores prisionais, Cartórios Extrajudiciais via CNJ, Ministério
do Trabalho, Ministério da Fazenda, Tribunal Regional Eleitoral).
3.5.
Saídas do preso
É muito comum, no sistema carcerário alagoano, verificarmos
presos em saída temporária, ou sendo levados a audiências, julgamentos e
tratamento de saúde, com a farda do estabelecimento penal, o que acaba causando
impacto negativo aos que com ele se deparam, trazendo certo prejuízo a sua
defesa e à ressocialização.
Portanto, sugere-se
que sejam encaminhados expedientes aos gestores das unidades prisionais no
sentido de providenciarem vestimentas, que não o fardamento da unidade,
adequadas para o preso quando necessita sair temporariamente.
IV
– CENTRO PSIQUIÁTRICO
A respeito desta
unidade, é preciso uma especial atenção. Verificamos pessoas que conta com mais
de vinte anos de internação, uma, em particular, conta com mais de trinta, o
que certamente viola qualquer regra constitucional de limites à execução penal.
Sugere-se
que sejam encaminhados expedientes aos gestores do sistema carcerário alagoano,
ao Tribunal de Justiça, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, bem como
aos demais órgãos parceiros na execução penal, provocando-os a se articularem,
junto com a Ordem dos Advogados do Brasil, na busca por soluções desse grave
problema de violação aos direitos humanos.
V
– CONSTRUÇÃO DE NOVAS VAGAS
Segundo constatamos, o
Estado já está em processo de construção de mais vagas no sistema carcerário.
Ocorre que, é
importante, antes de iniciar efetivamente a construção, ouvir os órgãos
envolvidos na execução penal, tais como o juízo das execuções, o Ministério
Público, a Defensoria, a OAB, os conselhos, os servidores, enfim, todos os que,
de uma forma ou outra, podem contribuir para evitar que sejam construídas novas
vagas com “velhos” problemas ou vícios.
Assim, sugere-se que, sempre que se
pretender realizar a construção de novas vagas, seja realizada uma audiência
pública a fim de colher sugestões dos principais atores e parceiros da execução
penal.
VI
– PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA
Antes de emitirmos
juízo de valor sobre a possibilidade jurídica dessa parceria, hoje muito
discutida entre especialistas, é preciso reconhecer que, mesmo não sendo
perfeito, o Presídio do Agreste, gerido internamente pela empresa Reviver[8], é
de longe o que melhor atende as principais determinações da Lei de Execuções
Penais brasileira no âmbito do sistema carcerário alagoano.
O Núcleo de
Ressocialização também serve como modelo, mas com uma diferença: ele escolhe no
âmbito de um processo seletivo, os presos que não tem perfil de gerar conflitos
no cumprimento da pena, o que não é permitido ao Presídio do Agreste, que
recebe os presos que para lá são encaminhados pela autoridade judiciária.
Apesar disso, diante
das inúmeras objeções que a doutrina brasileira especializada no assunto tem
levantado sobre tais parcerias, a principal delas é a transferência da gestão
da execução penal a funcionários terceirizados (descrevemos no relatório em
anexo), é preciso que o Estado mantenha-se aberto a aprimorar o sistema
atualmente vigente no Presídio do Agreste.
Penso que, a priori, o investimento com empresas
particulares para a gestão do sistema prisional, poderia também ser destinado
com vistas nos servidores efetivos, que, caso recebessem a estrutura nova
entregue à empresa que gere o Presídio do Agreste, poderiam desempenhar as
mesmas atividades.
Quanto à possibilidade
jurídica da parceria nos moldes da que atualmente é mantida entre o Estado e a
empresa Reviver no Presidio do Agreste, a matéria já foi motivo de recentíssima
deliberação do Poder Judiciário no Estado de Minas Gerais[9], tendo
sido provocado pelo Ministério Público, em cuja conclusão no acórdão
destaca-se:
“Portanto, declaro
a nulidade da intermediação de mão
de obra realizada pela PPP, tornando nulas as contratações dos
empregados admitidos irregularmente, determinando a substituição dos mesmos por servidores públicos, mediante a realização de concurso público, no prazo de 365 dias, sob pena de multa diária no importe de R$10.000,00, a ser aplicada ao primeiro e segundo réus, multa esta a ser revertida ao FAT. O Estado deverá se abster de realizar novos contratos ou aditivos contratuais com pessoa física ou jurídica para atuar na administração das unidades prisionais, sob pena de multa
diária no valor de R$ 500.000,00, por contrato celebrado ou aditivo contratual, valor este também reversível ao FAT”.
de obra realizada pela PPP, tornando nulas as contratações dos
empregados admitidos irregularmente, determinando a substituição dos mesmos por servidores públicos, mediante a realização de concurso público, no prazo de 365 dias, sob pena de multa diária no importe de R$10.000,00, a ser aplicada ao primeiro e segundo réus, multa esta a ser revertida ao FAT. O Estado deverá se abster de realizar novos contratos ou aditivos contratuais com pessoa física ou jurídica para atuar na administração das unidades prisionais, sob pena de multa
diária no valor de R$ 500.000,00, por contrato celebrado ou aditivo contratual, valor este também reversível ao FAT”.
31ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG. Processo n°
000750-71.2011.503.0110. Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Réus:
ESTADO DE MINAS GERAIS e GPA GESTORES PRISIONAIS ASSOCIADOS S/A.
Publicação: 19/03/2014 às 17:21 h.
Não bastasse isso, deve-se observar
ainda a Resolução nº 08/02 do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP[10], que aduz:
Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP[10], que aduz:
Art. 1º Recomendar a rejeição de quaisquer propostas tendentes à privatização do Sistema Penitenciário Brasileiro.
Art. 2º -
Considerar admissível que os serviços penitenciários não relacionados à segurança, à administração e ao gerenciamento
de unidades, bem como à disciplina, ao efetivo acompanhamento e à
avaliação da individualização da execução penal, possam ser executados
por empresa privada. (grifo nosso)
Nesse sentido, sugere-se que seja encaminhado
expediente ao Governador do Estado estimulando-o a realização de audiência
pública para discutir o assunto.
Ademais, é imperioso que seja encaminhado
expediente aos gestores do Presídio do Agreste, especialmente à
Superintendência Penitenciária, para que se adote procedimento em consonância
com o art. 41 da Lei de Execuções Penais que, dentre outras coisas, garante ao preso
ser identificado pelo nome e não por um número, como descrevemos no relatório
em anexo.
Ainda sobre o Presídio
do Agreste, sugere-se que
seja encaminhado expediente ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado para
que oriente os juízos criminais em não encaminhar para a referida unidade
prisional, presos além de sua capacidade, respeitando-se assim, seu bom e regular
funcionamento.
Faz-se necessário ainda
que, seja encaminhado ao
Governador do Estado expediente solicitando agilidade na disponibilização de
investimentos em abastecimento de água e energia (neste caso, em parceria com a
Eletrobrás), em todas as unidades prisionais, especialmente no Presídio do
Agreste.
VII
– MODIFICAÇÕES LEGISLATIVAS
Boa parte dos
investimentos financeiros em execução penal fica sob a responsabilidade do
Governo Federal, através do Fundo Penitenciário Nacional, razão pela qual, é
importante estimular a bancada federal do Estado a se empenhar na realização de
ações que visem facilitar o repasse dos necessários recursos.
Há no Senado da
República, projeto de lei (513/2013) que intenciona modificações na Lei de
Execução Penal (7.210/1984).
Nesse sentido, sugere-se encaminhar expediente
aos representantes do Estado no Congresso Nacional, especialmente ao Senador
Renan Calheiros, Presidente do Senado, solicitando que se empenhem na
construção de soluções para os graves problemas atualmente encontrados no
sistema carcerário local, sobretudo com o acolhimento das alterações propostas
pela Ordem dos Advogados do Brasil, através da Coordenação Nacional de
Acompanhamento do Sistema Carcerário – COASC, no PLS 513/2013, que modifica a
Lei de Execução Penal.
Sem mais para o
momento, certo de que todas as providências cabíveis serão prontamente adotadas
com o fim de evitar o agravamento do problema que, em persistindo, constitui-se
em flagrante violação da dignidade da pessoa humana, elevamos voto de estima e
distinta consideração.
Maceió, 05 de maio de
2014.
Francisco de Assis de França Júnior
Advogado inscrito na OAB/AL sob o nº 7315 – Representante
de Alagoas na Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário –
COASC, criada pela Portaria nº 11 de 16 de janeiro de 2014 do Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
[1] Disponível em:
http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={E9614C8C-C25C-4BF3-A238-98576348F0B6}&BrowserType=NN&LangID=pt-br¶ms=itemID%3D%7BA5701978%2D080B%2D47B7%2D98B6%2D90E484B49285%7D%3B&UIPartUID=%7B2868BA3C%2D1C72%2D4347%2DBE11%2DA26F70F4CB26%7D.
Acesso em: 06 de abril de 2014.
[2] Disponível em:
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/pedrinhas-o-maranhao-e-a-tragedia-carceraria-brasileira-3435.html.
Acesso em 01 de abril de 2014.
[3] Disponível em:
http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/os-presos-no-comando. Acesso em 01 de
abril de 2014.
[4] Disponível em:
http://sistemacarcerariooab.blogspot.com.br/2014/03/carta-conjunta-aprovada-apos-revisao.html.
Acesso em: 06 de abril de 2014.
[5] Disponível em:
http://g1.globo.com/brasil/noticia/2010/06/lingua-e-habitos-culturais-complicam-vida-de-presos-estrangeiros.html.
Acesso em: 09 de abril de 2014.
[6] Disponível em:
http://www.criminal.caop.mp.pr.gov.br/arquivos/File/ExecucaoPenal/CNPCP/n9de12jul2006.pdf.
Acesso em 16 de março de 2014.
[7] Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_intervencoes_ambientais_controle_tuberculose_prisoes.pdf.
Acesso em: 08 de abril de 2014.
[8] Disponível em: http://reviverepossivel.com/.
Acesso em: 01 de abril de 2014.
[9] Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/sites/default/files/Edi%C3%A7%C3%A3o%2022%20do%20Brasil%20de%20Fato%20MG.pdf.
Acesso em: 01 de maio de 2014.
[10] Disponível em:
http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/sistema-prisional/resolucoes/8-2002-conselho-nacional-de-politica-criminal-e-penitenciaria.
Acesso em: 01 de maio de 2014.
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