Cultura

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Relatório descritivo do sistema carcerário alagoano




ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário Brasileiro – COASC
 


RELÁTORIO DE VISITAS AO SISTEMA CARCERÁRIO ALAGOANO



Inicialmente, importa-nos informar que os dados colhidos nas visitas ao sistema carcerário alagoano e retratados neste relatório são fruto de coleta em dias previamente agendados com a equipe da Superintendência Penitenciária.
Tal método se justifica, em nossa concepção, por entendermos que, muito mais importante que identificar em inspeções as condições extremamente precárias que todos sabemos existentes, não apenas em Alagoas, mas na esmagadora maioria do sistema carcerário brasileiro, é entender como funcionam, por dentro, as diversas engrenagens dessa grande máquina encarceradora.
Com esse gesto, procuramos transmitir aos principais atores da execução penal nossa principal finalidade no âmbito da Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário – COASC: estabelecer parceria na identificação e na proposição de soluções.  
Para isso, o contato com servidores, presos e familiares, sem modificar a rotina do sistema, e dentro de um ambiente de parceria e serenidade, ajudou-nos no desenvolvimento deste relatório, por enquanto, de cunho muito mais descritivo que valorativo.
Ademais, optamos por não nominar as diversas pessoas que durante as visitas nos repassaram informações importantes sobre a atual situação das unidades que compõem o sistema carcerário alagoano, razão pela qual, sempre apontarmos tais informações, de modo geral, remeteremos à figura genérica dos servidores ou presos.
Por fim, não nos limitamos apenas ao aspecto descritivo do problema, muito embora seja ele imprescindível na busca por soluções exequíveis. Deste relatório, portanto, elaboramos uma carta de análise e sugestões que deverá ser entregue às autoridades direta ou indiretamente vinculadas ao funcionamento do sistema carcerário alagoano.
1ª visita técnica: dia 12 de março de 2014, às 9hs.
Nossa primeira visita foi realizada no Centro Psiquiátrico, localizado no complexo penitenciário do Estado. Acompanhado dos servidores Ricardo Bispo e Jeferson, este último responsável pelo setor visitado, percorri as dependências que atualmente abrigam cerca de 90 internados, destes sendo apenas 35 provenientes de medidas de segurança. A capacidade é para o abrigo de 105 pessoas. A primeira deficiência detectada foi a falta de informatização do controle do fluxo de entrada e saída de pessoas, isso não apenas no setor visitado, como também no portão de acesso ao complexo que concentra as principais e mais populosas unidades prisionais do Estado. A mesma deficiência se observou com relação à guarda de informações sobre os internados submetidos à medida de segurança ou a medidas cautelares. Segundo o relato de servidores com quem conversamos, uma das maiores dificuldades no processo de reintegração social dos internados é a falta de interesse dos familiares nesse processo. Para que se tenha uma ideia, dos 35 internados naquele momento, os familiares de apenas 10 procuravam alguma forma de aproximação durante o tratamento. Detectou-se ainda que o internado mais antigo, uma mulher, já conta com cerca de 30 anos sob a responsabilidade do Centro Psiquiátrico. Alguns outros internados, segundo as informações de servidores, já poderiam estar nas ruas, uma vez que já constatada a cessação de periculosidade, mas há dificuldade na liberação por conta da falta de circunstâncias, tais como residência fixa (muitos deles não são aceitos de volta pela família) e trabalho determinado, que dariam mais segurança ao juízo das execuções penais para determinar tal providência. No quadro de profissionais da saúde que atendem no local, informaram-nos a existência de dois psicólogos (os únicos com quem podemos conversar, por serem os únicos presentes naquele momento), assistente social, e três psiquiatras, estes últimos se revezam entre si nos dias de atendimento. O exame de periculosidade é confeccionado e assinado por um único psiquiatra. O Sistema Único de Saúde - SUS só é acionado quando há a necessidade de um exame de maior complexidade. Percebemos também que a grande maioria dos internados padece da falta de dentes, mas a notícia foi a de que há um dentista disponível, muito embora seja difícil orientar tais pacientes sobre a necessidade de escovação e formas de conservação dos dentes. O Departamento Penitenciário Nacional, mediante convênios, faz investimentos no Centro Psiquiátrico e com isso, são mantidas algumas atividades, como a praxiterapia, uma técnica de terapia ocupacional. Não há separação dos internados pela natureza do injusto que cometeram ou pela natureza da internação (se proveniente de medida de segurança ou por cautelar), tampouco pelo gênero, ainda assim a sensação é a de convivência harmônica. A preocupação é com a separação dos ingressos no centro viciados em drogas. As visitas íntimas são demandadas geralmente pelos internados cautelarmente, não havendo notícia de visitação íntima entre os submetidos à medida de segurança. Conversamos com alguns dos internados, dois deles dados à confecção de poesias, sendo que um deles se submeteu ao Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, tendo obtido, segundo as informações dos servidores, uma nota razoável. O Centro Psiquiátrico atualmente só abriga um internado com curso superior, sendo importante ainda ressaltar que chegamos a presenciar uma sala de aula sendo utilizada por uma professora (monitora), cedida pela secretaria estadual de educação, e por alguns dos internados, que se preocupavam em fazer anotações das lições postas no quadro. Algo que nos chamou a atenção é que a ala destinada às mulheres aparenta maior zelo, inclusive com a presença de plantas. Com relação à alimentação, a informação é a de que é produzida numa cozinha fora do centro, a ser visitada a posteriori, e fornecida em “quentinhas”, razão pela qual não chegamos a vê-la. De modo geral, o Centro Psiquiátrico tem aspecto físico razoável, com algumas dependências com aparente deterioração, inclusive os dormitórios dos internados, o que deve demandar pronta atuação no sentido de evitar que o ambiente se torne insalubre tanto para internados quanto para funcionários. Por fim, todos os servidores com quem conversamos se mostraram cordatos e atenciosos.
2ª visita técnica: dia 12 de março de 2014, às 10hs e 30min.
Na unidade prisional Santa Luzia, destinada às presas do sexo feminino, fomos recebidos, eu e o servidor Ricardo Bispo, destacado para me acompanhar, pela responsável pelo setor, Samara. A mesma deficiência de controle do fluxo de entrada e saída de pessoas foi detectada, uma vez não existir sistema informatizado e integrado entre as unidades do complexo e a gerência de todo o sistema prisional alagoano, sendo os registros feitos ainda à mão. A unidade tem capacidade para abrigar 74 presas, sendo que atualmente abriga 181, destas, 142 por força de medida cautelar de privação da liberdade. Encontramos espaço para sala de aula, com presas em atividade junto com uma professora (monitora), cedida pela secretaria estadual de educação para prestar tais serviços. De se ressaltar que há na unidade o funcionamento do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC, mesmo diante das rígidas exigências do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN para o ingresso de presas no programa, crítica feita por servidores à falta de observância das peculiaridades regionais para a sua efetivação nas unidades prisionais. Atualmente na unidade só existe uma presa com curso superior. Presenciamos ainda um grupo de presas em atividades laborais, tal como a confecção do filé, uma renda genuinamente alagoana. Segundo nos foi informado, há estímulo para a leitura, mas isso não tem sido remido da pena, uma vez que não há orientação do juízo de execução penal nesse sentido, autorizando a anotação na ficha das presas. O Sistema Único de Saúde – SUS não funciona na unidade, que possui uma enfermaria 24hs, sendo o órgão acionado apenas quando há a necessidade de realização de um exame de maior complexidade. Na triagem há a realização de exames preliminares para identificação de doenças como a AIDS. Pelo que fomos informados, há ainda uma preocupação com a alimentação das presas, observando-se as particularidades médicas de cada uma, evitando-se sal para as hipertensas, açúcar para as diabéticas e assim por diante. Com relação à alimentação, a informação é a de que é produzida numa cozinha fora da unidade, a ser visitada a posteriori, e fornecida em “quentinhas”, razão pela qual não chegamos a vê-la. Não existe refeitório na unidade, tendo as presas que se alimentarem em seus módulos. A separação, por conta da superlotação, privilegia o critério da adequação da presa ao módulo. Havendo tensão, servidores procuram conversar com as presas e convencionar essa separação. Constatamos que não há presença constante ou periódica da defensoria pública, muito embora haja sala para advogados conversarem reservadamente com suas clientes. As prisões, em sua grande maioria, são decretadas pelas 15º e 17º varas criminais da capital. Ademais disso, verificamos morosidade na homologação das informações que constam de processos administrativos, o que dificulta a efetivação de benefícios como livramento condicional e progressão de regime.  Não há espaço de recreação suficiente para todas, obrigando a um revezamento convencionado pelos servidores da unidade. Constatou-se ainda uma triste realidade, boa parte das mulheres não são procuradas por seus companheiros enquanto presas, ora porque não realmente o interesse ora porque também estão presos. Destaca-se a presença, segundo nos foi informado, de membros da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados –APAC, que procuram prestar auxílio de todas as formas às presas. As presas procuram participar de cultos religiosos e recebem essa assistência por parte de líderes de algumas igrejas que frequentam a unidade. As visitas mais constantes são a dos filhos, recebidos em espaço no interior da unidade especialmente cuidado pelas presas. De modo geral, a unidade tem aspecto físico em ótimo estado de conservação. Por fim, todos os servidores com quem conversamos se mostraram cordatos e atenciosos.
3ª visita técnica: dia 12 de março de 2014, às 11hs e 50min.
Visitamos o núcleo de estatísticas do sistema prisional alagoano, onde são processadas as informações referentes à população carcerária local. Fomos recebidos pela servidora Juliana, que nos disponibilizou relatório minucioso sobre as informações mais atualizadas do sistema carcerário. Fomos ainda ao centro de monitoração eletrônica, onde nos foi explicada a mecânica de funcionamento. Atualmente cerca de 350 pessoas estão sob monitoração eletrônica. O sistema emite alerta quando há violação das condições do monitoramento, mas há possibilidade de, por falha na conexão, constatação falsa de violação. Assim, antes de qualquer medida punitiva, segundo nos foi informado, toma-se o cuidado de se averiguar se o monitorado realmente violou as condições impostas. 
4ª visita técnica: dia 20 de março de 2014, às 9hs.
No Centro de Custódia, chamado de “cadeião”, fomos acompanhados pelos servidores Caetano e Ricardo Bispo, onde constatamos a mesma deficiência no controle do fluxo de entrada e saída, sem um sistema informatizado para tal. A unidade, que é considerada a porta de entrada de todo o sistema carcerário, tem capacidade para 240 presos, mas atualmente abriga 477. Há abrigo improvisado com tenda, para que em dias de visita, aos finais de semana, familiares dos presos não fiquem ao sol. Fomos informados que naquele dia eram esperados mais de 20 presos provenientes de delegacias. Chegamos no momento em que alguns familiares dos presos estavam fazendo cadastro em um sistema informatizado, onde além de armazenar informações pessoais captura a imagem. Cada preso tem direito a receber até 10 pessoas previamente cadastradas nesse sistema. Mesmo com detectores e raio-x há revista manual. As crianças são revistadas na presença dos pais ou responsáveis e por uma servidora. As visitas íntimas são permitidas de 15 em 15 dias. Segundo as informações de servidores, representantes da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados - APAC e membros do conselho da comunidade aparecem na unidade constantemente. A sala de aula foi fechada por conta da superlotação. Há apenas um preso com curso superior. Os presos, segundo informações dos servidores, preferem não ficar entrando e saindo das celas para gozar de alguns benefícios como participar de aula ou cursos profissionalizantes, e, dependendo da situação, como, por exemplo, após o horário de recolhimento, chamado de a hora do “tranca” (às 15hs e 30min), sair para receber advogados. A justificativa dada é no sentido de que há um código interno entre eles, pois os presos que ficam entrando e saindo com maior frequência ou fora dos horários “normais” podem estar levando informações de dentro às autoridades. As revistas nas celas geralmente ocorrem após esse horário, o que justificaria a desconfiança de caguetagem. Todos os módulos tem um representante, incumbido de se reportar aos servidores para resolver eventuais problemas. Segundo nos foi relatado por servidores, na triagem vê-se questões jurídica e de saúde, como a detecção de AIDS, tuberculose, diabetes e hipertensão. Na sala destinada à triagem de saúde nos deparamos com três presos “internados” e mais dois em processo de entrevista realizada por uma enfermeira. Encontramos um dos “internados” recém-operado de apendicite, deitado numa cama, utilizando como travesseiro uma garrafa do tipo pet, um outro, paraplégico, aguardava liberação para voltar à cela, e o outro, deitado sobre um colchão  no chão, portador de HIV e em tratamento contra tuberculose, aguardava para ser colocado em uma das camas ocupadas. Verificamos que há preocupação com a identificação de doenças e o devido tratamento, evitando-se, para aquelas contagiosas, sua contaminação na população carcerária e entre os servidores. Um dos maiores problemas, segundo os servidores, são as reações à abstinência, que acaba sobrecarregando a enfermaria da unidade. Fomos ainda à cozinha da unidade. A comida é preparada com certos padrões de higiene, encontramos, por exemplo, servidores com tocas e acompanhados por uma nutricionista, mas o teto do local apresentava acúmulo exagerado de gorduras e rachaduras na camada de tinta, necessitando de pronta intervenção. As comidas são servidas em depósitos de plástico, que são recolhidos e esterilizados após as refeições. Não há refeitório para os presos, que comem nas celas. Os familiares podem levar determinados alimentos, previamente informados em um folheto pela gerência da unidade, para os presos. A unidade conta ainda com um advogado, psicóloga, assistente social, médico e dentista, este último com um consultório equipado cuja maior demanda é a extração, além de fazer também obturação. O parlatório, que segue o padrão americano, com divisória em vidro, está desativado, apesar de existir uma sala para advogados na entrada da unidade. Segundo servidores, os presos estavam retirando pedaços de alumínio que prendiam os vidros. Fomos acompanhar a identificação de um preso numa sala que abriga um sistema chamado de SPIS, um sistema de identificação criminal por biometria e capturas de características físicas, algumas consideradas inalteráveis, inclusive tatuagens, e voz. O sistema, segundo pesquisamos, desenvolvido originalmente na Itália, armazena essas informações em um banco de dados informatizado, mas não obtivemos informações sobre o tempo que essas informações ficam disponíveis. Fomos ainda informados que a identificação é feita em todos, mas, reconhece-se que, algumas vezes pelo fluxo de entrada e saída intenso na unidade, pode acontecer de alguém não passar pelo sistema. A unidade conta com uma quadra, mas não tem sido utilizada por conta da superlotação. São oito agentes designados para a unidade. A separação é feita basicamente com base na conveniência, ou seja, com vistas a evitar desavenças ou conflitos. De modo geral, a unidade tem estado de conservação já exigindo pronta intervenção para que não se torne insalubre, apesar de as celas já estarem neste estado. Por fim, todos os servidores com quem conversamos se mostraram cordatos e atenciosos.
5ª visita técnica: dia 20 de março, às 10hs e 30min.
No Núcleo de Ressocialização, destinado a receber presos que estão próximos da progressão, existem 128 presos, mas sua capacidade é de 150. Fomos recebidos pelo servidor Sócrates, que nos guiou durante a visita. Há também deficiência no controle do fluxo de entrada ou saída. Não há sistema informatizado nesse controle. Interessante é que um dos presos também foi convidado a nos acompanhar, para solucionar eventuais dúvidas. A demanda para ingressar na unidade é grande, havendo processo seletivo para determinar quem será abrigado. Uma comissão de servidores se dedica a analisar o perfil dos presos que se candidatam a ingressar na unidade. Encontramos uma biblioteca com mais de mil e duzentos livros, dos mais variados assuntos, sendo que os mais procurados são os de auto-ajuda, literatura e Direito. Conhecemos as salas de aula, muito bem equipadas, identificadas com nomes de escritores alagoanos. Há presos da unidade no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC e aprovados no ENEM, tendo inclusive feito a matrícula. Vimos ainda uma sala de informática e uma sala de música, muito bem conservadas. Não há nenhum preso com curso superior. O SENAI mantém um setor para a profissionalização dos presos, com cursos como encanador e pedreiro. A unidade é só para homens, não abrigando mulheres. O parlatório segue o modelo americano, mas, ao invés de vidros, é dividido por grade de ferro. Apesar disto, há uma sala para advogados em perfeito estado de conservação. Segundo as informações de servidores há médica, psicóloga, assistente social, nutricionista e dentista. Conhecemos o consultório médico, a sala do dentista e o alojamento dos servidores, ambientes com ar refrigerado e em excelente estado de conservação. Há uma comissão de presos que ajudam na identificação dos problemas e na busca por soluções junto com a direção da unidade. A comissão de presos é escolhida dentro de um processo democrático, com oportunidade para campanha e votação em urna. O mandato é de 30 dias, vedada a recondução dos eleitos. Os presos fazem reuniões com deliberação e a confecção de atas. A assistência religiosa é geralmente prestada por pastores que visitam a unidade. Vimos os alojamentos destinados a visita íntima, muito bem conservados, e controlado pela comissão de presos. As celas abrigam atualmente entre três e quatro presos. A separação é feita basicamente com base na conveniência, ou seja, com vistas a evitar desavenças ou conflitos. A unidade conta ainda com uma barbearia, operada pelos presos, uma quadra ampla, onde se organizam torneios, uma lavanderia, e um refeitório, onde são consumidas as refeições com a utilização de talheres de alumínio com a identificação dos presos, sem que tenha havido registro de problemas com isso até o presente momento. Caso ocorra desvio dos talheres, como são identificados, logo se sabe quem o teria feito. Conhecemos um quadro que fica na entrada das alas com diversas informações para os presos. Desde regulamentos para o troneio de futebol interno, a um esquema de acompanhamento de faltas dos presos. Cada preso tem a possibilidade de no máximo três faltas por mês (deixar de forrar a cama, guardar seus pertences, discutir com colegas ou funcionários, enfim), podendo deixar a unidade. As faltas, que não excedam o limite de três, podem ainda ser “apagadas” caso o preso faça uma avaliação com base em um livro que terá de ler. Até o momento, a unidade não tem registro de fugas ou desavenças sérias. Todas as dependências estão em excelente estado de conservação e foi inaugurada em 2003. Por fim, todos os servidores com quem conversamos se mostraram cordatos e atenciosos.
6º visita técnica: dia 28 de março de 2014, às 9hs.
No Presídio Cyridião Durval, destinado a receber presos provisórios, existem atualmente 671 presos, sendo sua capacidade para 390. Nesta visita, fomos acompanhados pelo servidor Gilton de Messias, destacado pela Superintendência Penitenciária para nos acompanhar nas visitas do dia, bem como pelo servidor José Rubens, um dos responsáveis pela gerência da unidade. Há abrigo para que em dias de visita, aos finais de semana, familiares dos presos não fiquem ao sol. Em nossa chegada, vimos a mesma deficiência que encontramos em todas as outras unidades, ou seja, falta de identificação e registro informatizado no controle do fluxo de entrada e saída. Ademais disso, segundo as informações que colhemos com servidores no local, há dias em que falta servidor para guarnecer a entrada da unidade. A propósito, uma das maiores reclamações que ouvimos no local foi quanto à carência no quadro de servidores, o que sobrecarrega alguns e dificulta o bom desenvolvimento das atividades programadas. No primeiro momento, fomos à sala do fiscal, uma espécie intermediário entre os presos e os visitantes e advogados. A unidade também adota o mesmo sistema de separação observado nas demais, ou seja, segue-se o padrão da conveniência, procurando-se evitar conflitos internos, havendo-se preocupação, inclusive, com relação a facções. As informações que nos passaram dão conta de pelo menos duas facções na unidade: Primeiro Comando da Capital – PCC e Firma, esta, genuinamente alagoana, seria uma espécie de prestadora de serviço da primeira. Há ainda relatos da presença de integrantes do Comando Vermelho – CV, mas servidores afirmaram que sobre esta última, havia apenas desconfiança da existência de seus representantes na unidade. Encontramos presos participando de avaliação em sala de aula com a presença e uma professora. Na unidade são apenas dois presos com curso superior. O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC também funciona com presos da unidade. Fomos até a cozinha, ampla e arejada, em bom estado de conservação, onde tivemos que utilizar tocas por questões de higiene. Vimos, além de funcionários, presos auxiliando no preparo da comida. Segundo a responsável pelo setor, agentes da vigilância sanitária vistoriaram o local e recomendaram algumas adaptações, não constatando nenhum problema sério no tocante a higienização. Há preocupação com presos que precisam de comida especial, por conta de diabetes, hipertensão, etc. o cardápio da semana fica afixado na parede para controle. A comida confeccionada ali serve para duas unidades: o Cyridião Durval e o Presídio de Segurança Máxima, anexo ao primeiro. Servidores também se alimentam da comida servida aos presos. Por conta das “gambiarras” feitas pelos presos em suas celas, o que prejudica o fornecimento de energia, no período da noite há a necessidade de utilização de um gerador, que vimos em um cômodo anexo à cozinha. As condições físicas já requerem intervenção pela deterioração. O banheiro de funcionários e visitas está em condição precária. O raio-X está quebrado. O detector de metal está funcionando, mas ainda assim, revistas manuais são realizadas em salas próprias. As crianças, segundo os servidores, são revistadas manualmente na presença das mães. Há uma sala para a defensoria e um parlatório, em condições precárias, estilo americano, com divisórias em ferro. O mesmo código contra a caguetagem existente no Centro de Custódia é alimentado na unidade. Cada ala tem seu representante e vice representante, escolhidos sem qualquer interferência dos servidores. São nove módulos, alguns recebem denominações que remetem ao comportamento ou perfil dos presos. Segundo nos informaram, em apenas quatro módulos era possível entrar, nos demais se encontravam presos mais agressivos. Fomos a dois dos módulos que permitiam a entrada, onde alguns dos presos trabalhavam e outros aguardavam a oportunidade para tal. O acesso ao trabalho, portanto, só é permitido aos presos que estavam em um desses módulos onde se permitia entrar com maior tranquilidade, como fizemos. Os módulos que entramos são conhecidos por “respeito”, “trabalho” e “cristão”. No módulo “respeito” nos comunicamos com o representante, que prontamente deu o comando para que todos os demais companheiros entrassem em suas celas para que pudéssemos entrar nas dependências. Com os presos nas celas, e agentes à frente, verificando se realmente estavam trancadas, passeamos pelo corredor observando as condições do local. As celas em estado precário, com presos amontoados, demandando pronta intervenção. A visitação íntima é realizada ao estilo “come quieto”, ou seja, nas celas com a divisória de um lençol entre um casal e outro. Fomos ainda ao módulo “trabalhador”, onde foi possível andar sem a necessidade dos presos serem colocados em cela. Nesse módulo são cerca de dois presos por cela, que eles chamam de quarto. No módulo “cristão” também não houve necessidade de solicitar aos presos que ficassem nos quartos. Conversamos com o vice-representante, pois o representante estava trabalhando na parte externa da unidade. Os dezenove presos do módulo “cristão” estavam de mãos (postura muito comum em todos os presos com os quais encontramos) para trás e organizados junto à parede enquanto observávamos o local. Encontramos neste módulo presos na expectativa de serem escolhidos para o Núcleo Ressocializador. Vimos ali ainda um estrangeiro, da República Tcheca, que se dedicava ao artesanato no momento. A unidade conta com enfermeiro, técnico em enfermagem, dentista, psicóloga e assistente social com os quais conversamos. Segundo os servidores há também médico na unidade, mas não chegamos a vê-lo. Todas as dependências precisam de pronta intervenção na estrutura bastante deteriorada. Por fim, todos os servidores com quem conversamos se mostraram cordatos e atenciosos.
7ª visita técnica: dia 28 de março de 2014, às 10hs e 40min.
No Presídio de Segurança Máxima, criado há cerca de dois anos, com capacidade para 192 presos, que abriga atualmente 133, eu e o servidor Gilton de Messias, fomos recebidos pelo servidor Allan Acioly, responsável pela unidade. Não há controle informatizado do fluxo de entrada e saída da unidade, o que se observa em todo o sistema prisional alagoano. Fomos à sala do fiscal, que nos explicou a mecânica de funcionamento da unidade. Ao fiscal, como já havíamos constatado na visita anterior, incumbe a tarefa de intermediar o contato entre os presos e as visitas e advogados. A unidade, de segurança máxima, está com o raio-X quebrado, encontrando-se nas mesmas condições os portais detectores de metal, câmeras de vigilância e bloqueadores de celular. A deficiência da falta de servidores também é visível, tendo sido lembrada por alguns dos quais conversamos na visita. No local ficam os presos considerados mais perigosos, que estavam na iminência de fugir de outras unidades, também integrantes de facções como o Primeiro Comando da Capital – PCC e Firma. Segundo informações dos servidores, há uma preocupação do Estado para que não se ultrapasse a capacidade da unidade, pois a mesma serve ainda para abrigar presos em trânsito, ou seja, aqueles que, em virtude de audiências, são deslocados para algumas regiões do interior e precisam passar pela capital. Não há sala de aula, nem oportunidade para trabalhar. São duas horas de banho de sol por dia. Ao chegarmos, os presos estavam nos pátios. São dois pátios, com presos divididos pela conveniência de não gerar conflitos. Um deles, inclusive, quando chegamos, estava na dependência destinada à visitação íntima, uma vez que, segundo os servidores, não tinha condições de convívio com os demais. Fizemos visita inicialmente pela parte de baixo, onde se encontram as celas e outras dependências, inclusive o parlatório (com lâmpadas queimadas, e seguindo o sistema americano, com divisórias em vidro e a necessidade do uso de interfone), e logo após fomos à parte de cima, onde dá para observar as alas e os pátios. A agua e a energia das celas são liberadas individualmente em dispositivo localizado nessa parte de cima da unidade. O alojamento dos servidores estava em condições precárias, com colchões de qualidade questionada. Ouvimos reclamação sobre a comida, não apenas quanto à qualidade, mas sobre a quantidade também. As dependências, de modo geral, estavam em boas condições. Por fim, todos os servidores com quem conversamos se mostraram cordatos e atenciosos.
8ª visita técnica: dia 02 de abril de 2014, às 9hs.
No Presídio Baldomero Cavalcante, com capacidade para 669, mas abrigando atualmente 762, destinada a receber presos condenados, fui acompanhado pelos servidores Marcellus Marcato, gerente da unidade, e Guilherme, responsável pelo gerenciamento das demandas dos presos. Não há controle informatizado para o fluxo de entrada e saída da unidade, sendo ainda utilizados papeis para anotação de eventuais visitas, inclusive de advogados. Apesar disto, os familiares dos presos são cadastrados em um sistema. Há abrigo para que em dias de visita, aos finais de semana, familiares dos presos não fiquem ao sol. Começamos conhecendo a área administrativa da unidade, onde percebemos uma estrutura razoavelmente conservada e servidores muito receptivos. Ainda assim, verifica-se que há deficiência no manuseio de informações, com a falta de sistema informatizado integrado com os diversos setores da administração penitenciária. O portal detector de metais estava em funcionamento, mas a máquina de raio-x se encontrava quebrada. As revistas manuais são feitas por dois servidores, inclusive em crianças, mas, nesse caso, na presença da mãe. As visitas, nos finais de semana, podem passar o dia, não havendo, pois, quem as observe durante sua estadia nos módulos, o que pode provocar situações de abuso. Há deficiência ainda pela falta de servidores, especialmente agentes, havendo dias de apenas quatro agentes trabalharem no local. O parlatório segue o estilo americano, mas com grades de ferro separando cliente e advogado, encontrando-se com deficiência de iluminação. Há um acompanhamento jurídico dos presos sem assistência por parte de uma advogada contratada pela SGAP, que participa, inclusive, dos procedimentos administrativos disciplinares internos. O conselho da comunidade, segundo informações que recebemos de servidores, atua na unidade, além da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados – APAC. Periodicamente líderes religiosos fazem visitas à unidade, especialmente evangélicos, que pregam para os presos da porta do módulo. A visita íntima é realizada nos finais de semana e se dá em rodízio entre os presos na utilização das celas. A unidade conta com médico, que atende uma vez por semana, enfermeiros e técnicos, dentista, psicólogo, assistente social e advogado. Os servidores possuem alojamentos, comem da comida fornecida pela cozinha do Cyridião Durval, havendo reclamação sobre a qualidade, e contam com um refeitório próprio. Já os presos, comem no pátio de seus módulos. Durante o dia os presos não ficam recolhidos nas celas, mas no pátio de seus módulos, quando na hora do “tranca”, por volta das 16hs e 30min, são conferidos por chamada e recolhidos nas celas. No ano passado houve um mutirão que deu uma desafogada na unidade, que ainda opera acima de sua capacidade. A separação dos presos é feita pela conveniência, ou seja, pelo convívio, assim, procura-se evitar focos de tensão e conflitos. Os acusados de crimes sexuais são colocados no módulo denominado de “trabalhador”, que não cria nenhum tipo de problema com esta circunstância. A entrada de um preso num módulo deve ser consensual. Durante um período, cerca de dez dias, o preso novato fica na triagem, onde será “avaliado” pelos demais, não havendo objeção, ele passa a integrar o modulo. As facções encontradas na unidade são o Primeiro Comando da Capital – PCC, a Firma e o Comando Vermelho, mas servidores procuram não levar isso em conta no trato com os presos para que não se fomente um “status” entre eles. Nos módulos especiais, mais conservados que quaisquer outros, além de condenados, vimos presos provisórios, inclusive militares, que reclamavam pelo fato de não estarem em unidades militares. Na unidade há duplo comando, ou seja, há uma gerencia responsável pela parte administrativa, e uma célula composta por servidores contratados, de contato direto com os presos, que não se reporta a esta gerência, mas diretamente à Superintendência Penitenciária – SGAP. Em casos de intervenção, por conta de conflito ou algo do gênero, ou até mesmo acesso às celas para revista, é preciso obter autorização deste comando na SGAP. As revistas não são periódicas, ocorrem apenas quando há algum tipo de desconfiança. Há conferência de presos diária, por intermédio de chamada nas celas. Em nenhum dos módulos em atividade, com a exceção dos especiais, foi possível entrar, segundo os servidores, por questões de segurança. Mas ainda assim, conseguíamos ver que, em se tratando de salubridade, as condições não eram das melhores, carecendo de pronta intervenção. Conhecemos uma ala desativada que se pretende utilizar para ampliar a capacidade da unidade, além de uma outra que está em reforma. Cada módulo tem seu representante e vice, escolhidos sem a interferência dos servidores. Atualmente são 36 presos trabalhando internamente e 70 saem com a mesma finalidade. Na unidade também funciona o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC. Não há trabalho para todos, portanto, muitos aguardam a oportunidade. Vimos cinco salas de aula, duas em funcionamento, com presos realizando atividades sob a orientação de professores. O período de maior frequência em sala é durante a noite. Existem oito presos com curso superior na unidade, além de muitos analfabetos. Há uma preocupação com o controle de doenças como AIDS, tuberculose, hipertensão, entre outras. A estrutura da enfermaria é muito boa e encontramos presos em atendimento. Há sempre uma enfermeira de plantão durante a semana. 52 presos recebem psicotrópicos por prescrição médica. No mês de março se encontravam na unidade em fase de tratamento e controle: 21 presos com hipertensão, 10 com diabetes, 6 com tuberculose e 5 com doença sexualmente transmissível. Durante nossa visita, vimos presos sendo vacinados contra o tétano, hepatite e a tríplice viral, mas uma cena nos chamou a atenção nesse momento: um servidor, descaracterizado, com o que parecia uma doze de repetição nas mãos, em posição de ataque, mas sem apontá-la, há menos de dois metros da equipe de profissionais da saúde e dos presos que (em número de cinco) estavam em fila e com as mãos para trás. Um dado interessante que merece destaque foi a oficialização em cerimonia na unidade, há poucos dias de nossa visita, de uma união homoafetiva entre dois presos da unidade. Há, portanto, uma preocupação com a separação de presos homossexuais com alguns outros que não aceitam essa opção. Dos sete módulos, apenas dois aceitam presos homossexuais sem problemas. A unidade não conta com câmeras de vigilância. Os ambientes de circulação de presos e servidores na unidade se encontram em bom estado de conservação, com a exceção, segundo já dissemos, das celas que conseguimos visualizar de não muito perto, que precisam de intervenção. Há muita regressão de regime, segundo as informações dos servidores. Por fim, todos os servidores com quem conversamos se mostraram cordatos e atenciosos.
9ª visita técnica: no dia 30 de abril de 2014, às 11hs.
No Presídio do Agreste, que funciona no sistema de cogestão público-privada, situado no município de Girau do Ponciano, com capacidade para 789 presos, abrigando atualmente 781, destinado a receber presos provisórios e condenados, fui acompanhado pelo servidor Gilton de Messias, bem como por outros servidores vinculados à Superintendência Penitenciária e funcionários da empresa contratada para gerir a unidade. Inaugurado em 2013, vale dizer, que a participação do Estado na gestão da unidade prisional se resume à escolta de presos, quando precisam se fazer presentes em audiências, por exemplo, e à guarda externa da unidade, as demais atividades são de responsabilidade de funcionários contratados pela empresa Reviver. Segundo os funcionários da empresa, a mesma mantém no Estado 292 funcionários (entre eles, advogados e diversos profissionais da área da saúde), tem experiência na gestão de unidades prisionais, sendo certificada pela ISO 9001 de qualidade, estando presente em mais cinco estados da federação. Logo na chegada à unidade, constatamos um procedimento padrão de cuidado com a segurança. A mala de nosso veículo teve que ser aberta para adentrarmos ao estacionamento interno, além de sermos conduzidos à sala de cadastro e identificação para que nos autorizassem a percorrer as dependências internas. Há um sistema de dados informatizado que é compartilhado entre o Estado e a empresa, tendo os dois (inclusive o Alcatraz, utilizado pelo Estado) que ser alimentados. O acesso de advogados, segundo o que colhemos, é facultado todos os dias das 08 à 17hs. Apesar de cada módulo possuir um parlatório (no estilo americano, com vidros e comunicação por interfone), não há sala da OAB na unidade, mas representantes da empresa se mostraram interessados em estabelecer parceria nesse sentido. Há uma sala para a defensoria pública, que, segundo colhemos, é presença constante na unidade. O juiz das execuções e o representante do Ministério Público também comparecem periodicamente na unidade. Conhecemos as salas da administração da unidade, inclusive a sala onde três funcionárias faziam o monitoramento das imagens das 125 câmeras instaladas pelo local. Segundo a gerência da empresa, o monitoramento é feito 24hs e as imagens ficam à disposição das autoridades durante 30 dias, caso queiram esclarecer algum desvio de comportamento tanto de presos quanto de funcionários. Nosso acesso aos corredores dos módulos só foi permitido após revista por detector de metal. Todos, inclusive os gerentes (da empresa e do Estado), submeteram-se ao procedimento. A estrutura física é muito semelhante ao Presídio de Segurança Máxima em Maceió. O raio-x estava quebrado, segundo as informações que colhemos, nunca chegou a funcionar desde a inauguração. Assim como também se encontra quebrado o sistema de identificação criminal por biometria e capturas de características físicas, algumas consideradas inalteráveis, inclusive tatuagens, e voz, chamado de SPIS. Há problema com água na unidade. O fornecimento é realizado por cerca de vinte e dois carros-pipa diariamente, uma vez que a tubulação da Companhia de Abastecimento de Água - CASAL não passa pelo local. A unidade conta com um sistema de reaproveitamento de água, que é utilizada na manutenção dos jardins. O fornecimento de energia também é precário, havendo necessidade de utilização constante do gerador, cuja assistência, segundo o que colhemos, é precária. A separação dos presos é feita com foco em evitar conflitos, não sendo possível, segundo colhemos, separar com base nas determinações da Lei de Execuções Penais, apesar de, na maioria das vezes, procurar-se respeita-la neste aspecto. São 7 módulos. Cada módulo possui 16 celas. São cerca de oito presos por cela. Existem 12 suítes para visitação íntima. Na visita íntima, de uma hora, e realizada quinzenalmente, só tem acesso apenas quem comprova o vínculo com o preso por meio de documento de união estável ou certidão de casamento. Há fornecimento de camisinha. Os presos possuem 4 horas de banho de sol por dia, que é quando ficam nos pátios dos módulos (o restante do dia ficam recolhidos nas celas), 4 alimentações diárias, sendo proibida a entrega de alimentos pela família. Tudo o que o preso precisa (roupas, alimentação e material de higiene) é fornecido pela empresa, havendo inclusive o controle de entrega com o preso tendo que assinar o recebimento. Alguns materiais, como roupas e toalhas, possuem uma numeração que corresponde ao preso. Vimos a sala de almoxarifado repleta de produtos. Em caso de faltas dos presos, há contraditório e ampla defesa, segundo coletamos, na realização de procedimento administrativo disciplinar. Ao entrar na unidade os presos passam por um processo de triagem, tendo que ser conduzido a higienização, inclusive com o corte do cabelo. No momento em que estávamos na unidade, chegaram dez presos e acompanhamos parte desse processo. As visitas são realizadas aos finais de semana. Os familiares passam por um processo de revista manual, inclusive crianças, segundo os gerentes da empresa, que realizam o procedimento, sempre acompanhadas da mãe. Há salas específicas para essa revista. Segundo a gerência da empresa, pretende-se adquirir um scanner para evitar ao máximo esse tipo de revista. Encontramos uma representante da igreja adventista na unidade. Segundo o que coletamos, os presos procuram muito assistência religiosa.  Vimos ainda o alojamento dos servidores, em condições precárias, diga-se. Homens e mulheres dividem o mesmo espaço, percebendo-se um mal estar com a situação. A gerência da empresa nos mostrou uma sala que está preparando para que essa separação seja feita, e que as funcionárias tenham um alojamento separado. A ala destinada a cozinha se encontra em excelente estado de conservação, refletindo-se na qualidade da alimentação. Há uma câmara frigorífica e uma nutricionista que orienta o preparo da comida. Há ainda um controle da comida para os presos que precisam de cuidados especiais neste aspecto. O acesso à cozinha é controlado e nenhum preso trabalha nela. Vimos ainda uma lavanderia em ótimo estado de conservação dotada de máquinas industriais novas onde alguns presos têm a oportunidade de trabalhar. Atualmente, segundo a gerência da empresa, 31 presos trabalham, apenas internamente. Vimos uma das 6 salas de aula da unidade, que se encontrava em excelente estado de conservação. São cerca de 80 presos estudando. No tocante ao ensino, também há parceria com o SENAI. Vimos uma serigrafia e uma fábrica de corte e costura, onde presos também trabalham na confecção de materiais têxteis (farda, por exemplo) usados na unidade. A ala médica que visitamos também se encontra em excelente estado de conservação, além de possuir um depósito de medicamentos. A unidade conta com bloqueadores de celular em funcionamento. Os pátios dos módulos possuem uma pequena quadra de futebol e mesas, além de uma televisão que transmite apenas dvd´s, sem acesso a notícias do mundo exterior. A gerência da empresa disse que organiza, com o auxílio de professores de educação física, campeonatos de futebol e outras modalidades para ocupar os presos. A biblioteca ainda não está pronta, mas já possui alguns livros como vimos. Há um refeitório espaçoso para os funcionários, inclusive com ambiente para jogos como pebolim nos intervalos. Por fim, todos com quem conversamos se mostraram cordatos e muito atenciosos.

Relatório sugestivo ao sistema carcerário alagoano




ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário Brasileiro – COASC
 


Ofício nº 001/2014


Maceió, 05 de abril de 2014.

À sua excelência o senhor
Dr. Thiago Rodrigues Pontes Bomfim
Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Alagoas.

Assunto: Apresentação de sugestões e análise dos relatórios de visitas ao sistema carcerário alagoano

Senhor Presidente,

Após uma série de visitas técnicas ao complexo carcerário alagoano e de ter participado de uma série de debates sobre o sistema carcerário brasileiro, promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil durante o início do corrente ano na sede do Conselho Federal em Brasília, junto a diversas entidades governamentais e não governamentais, valemo-nos do presente expediente para apresentar os relatórios em anexo, bem como nossa avaliação e sugestões para a busca por melhorias.
Antes de qualquer coisa, em julho de 2012, representantes do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP e da Secretaria de Direitos Humanos realizaram inspeção nas unidades que percorremos, encontrando inúmeras irregularidades.[1]
Em nossas visitas técnicas, tornamos a encontrar algumas das deficiências já relatadas nas inspeções acima referenciadas, mas outras nos pareceram equacionadas, razão pela qual iremos focar naquelas que têm prevalecido e que carecem de pronta intervenção das autoridades competentes.
No entanto, não há, frise-se, por aqui, o horrendo cenário encontrado atualmente em Pedrinhas[2], no Estado do Maranhão, ou no Presídio Central de Porto Alegre[3], no Rio Grande do Sul, o que não quer dizer que as atuais condições atendam às regras determinadas pela Constituição Federal ou que não careçam de nossa preocupação e atuação para evitar o agravamento da crise.
Ademais, cumpre ressaltar ainda que a Comissão do Advogado Criminalista e Relações Penitenciárias da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Alagoas, muito nos ajudou, fornecendo subsídios para as análises das informações coletadas.
Assim, as sugestões referidas alhures, por questões práticas, conforme se estabeleceu na discussão em nível nacional, serão distribuídas basicamente em três eixos fundamentais: I – controle do fluxo de entrada; II – controle do fluxo interno; III – controle do fluxo de saída.
Vale ainda ressaltar, que tais sugestões, apesar de terem sido discutidas, em sua grande parte, com vistas ao panorama nacional, estão devidamente adequadas às particularidades locais, uma vez que percorri todas as unidades prisionais de Alagoas, inclusive a unidade de internação de menores, sempre acompanhado de representantes da Superintendência do Sistema Prisional.
I – CONTROLE DO FLUXO DE ENTRADA
Neste tópico, a intenção é a de avaliar de que forma o ente responsável pela privação da liberdade procede ao introduzir o sujeito no sistema carcerário e de que forma lida com as pessoas que precisam circular pelas dependências das unidades carcerárias.
1.1.  Sistema de informações em tempo real
É a informação um dos bens mais preciosos na formulação de políticas de segurança pública e de execução penal. Trabalhar estratégias de prevenção e resolução de conflitos, dentro ou fora do sistema carcerário, o mais próximo possível da realidade é fundamental para alcançar os resultados desejados. Portanto, apesar de apontarmos esse item dentro deste primeiro eixo, não custa lembrar que sua importância abarca todos os demais.
Sobre este ponto, a Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Paraná é modelo para o Brasil, com um sistema de informações que possibilita de forma segura mensurar a população carcerária, nominar os encarcerados, identificar as infrações que cometeram, dentre outras circunstância tão importantes quanto.
Pelo que pudemos constatar, apesar dos esforços de abnegados servidores com os quais nos deparamos durante a série de visitas que fizemos no complexo prisional, há séria deficiência a esse respeito.
Os computadores armazenam as informações dos presos, mas, apesar dos sistemas que utilizam (como “Alcatraz” e “SPIS”) não há articulação eficiente entre eles, nem com sistemas de outros Estados, impossibilitando, dentre outras coisas, o conhecimento rápido do funcionamento de todo o sistema alagoano em tempo real.
O controle do acesso ao complexo prisional no bairro do Tabuleiro, na capital do Estado, bem como o controle do acesso de pessoas nas unidades é precário e ainda calcado basicamente na anotação em papel dos dados das pessoas que lá comparecem durante a semana.
A unidade que mais se aproxima do modelo ideal de coleta e controle das informações é o Presídio do Agreste, apesar das deficiências que ainda possui, como, por exemplo, a precariedade de articulação entre os gestores da referida unidade e os gestores que ficam baseados na Capital.
Sugerimos, além de procurar-se maior articulação das informações sobre o sistema, adotar, o BI/SIGEP/BRASIL - Business Inteligence, Sistema de Gestão da Execução Penal, instituído pelo Conselho Nacional de Secretários de Estado da Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Prisional – CONSEJ, contando-se, inclusive, para isso, com o apoio da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, que servirá para gerenciar os dados dos presos e dos estabelecimentos penais, atualizados diariamente, e por servidores exclusivamente dedicados a isso, como ferramenta para:
a) diagnóstico de situação em estabelecimentos penais sobre 1) quem são os encarcerados, 2) onde estão recolhidos, 3) número, tipo e regime de cumprimento de pena adotado nos estabelecimentos penais, 4) quais as condições carcerárias, de forma e orientar Mutirões Jurídicos Temáticos;
b) diagnóstico de situação em carceragem de delegacias de polícia sobre 1) quem são, 2) onde estão recolhidos, 3) quais as condições carcerárias 4) localização, de forma a orientar Mutirões Jurídicos Temáticos;
c) tomada de decisões de gestão sobre a) classificação de presos; b) transferências, c) equilíbrio da população carcerária; d) situação individual do cumprimento da pena; e) sobre necessidade de ampliação, reforma e construção; f) medidas necessárias para ressocialização; g) monitoração eletrônica.
d) integração interinstitucional (Judiciário, Executivo, Advogados, Defensoria, Ministério Público, Conselho Penitenciário, entre outros).
Vale frisar que, o esquema acima traçado, pode ser também encontrado da carta conjunta feita entre o Conselho Nacional de Secretários de Estado da Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Prisional e a Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário – COASC.[4]
Dessa forma, sugerimos contato com a secretária daquele Estado da federação, Maria Tereza Uille Gomes, que, em reunião em Brasília, em fevereiro do corrente ano na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, disponibilizou o sistema para todos os Estados, inclusive se colocando à disposição para troca de ideias a fim de que se implante em Alagoas a mesma forma de gerir os dados relacionados ao sistema carcerário.
Por fim, urgem providências a esse respeito, respeitando-se o princípio constitucional da eficiência (art. 37), sobretudo diante da proposta de adoção da informatização plena no sistema carcerário por parte do PLS 513/2013, tramitando no Senado da República, que dispõe sobre a reforma da Lei de Execução Penal.
O controle das informações do sistema carcerário, não apenas sobre os presos, mas sobre os servidores também, com suas escalas, frequências, procedimentos pelos quais respondam entre outras circunstâncias, é item dos mais importantes, merecendo e precisando receber a atenção e pronta intervenção do Estado.
Nessa esteira, a profissionalização do sistema de execução penal, que passa obrigatoriamente por esse processo de informatização, é uma necessidade que se impõe.
1.2. Carceragem em delegacias
Os presos em flagrante, ou provenientes de prisões cautelares, conforme verificamos, tem se amontoado em delegacias espalhadas pelo Estado, o que dificulta até mesmo mensurar com um grau aceitável de segurança a população carcerária alagoana (o número é certamente muito maior do que o que consta dos documentos dos órgãos oficiais), além do fato de desvirtuar o trabalho de policiais civis, que acabam se prestando ao papel de agentes penitenciários e não se dedicando como deveriam ao seu papel constitucional, comprometendo-se assim, todo potencial de efetividade do sistema penal.
Dessa forma, sugere-se acabar, a exemplo do que já fez o Estado do Rio de Janeiro, com uma população carcerária muito maior que a alagoana, com as carceragens em delegacia de polícias, fazendo com que todas as pessoas que tenham sua liberdade privada pelo Estado passem diretamente a integrar oficialmente o sistema carcerário.
É essa, inclusive, a previsão do art. 204 do PLS 513/2013, sendo discutido atualmente no Senado da República, que dá prazo de quatro anos para que os Estado acabem definitivamente com as carceragens em delegacias.
Sugere-se ainda que seja encaminhado expediente aos gestores do sistema carcerário alagoano, solicitando que incluam como unidade prisional, no cálculo das estatísticas especialmente, o Cadeião de Arapiraca, que atualmente, segundo as informações que recolhemos, conta com mais de 100 presos.
1.3. Separação
1.3.1. Condenados X Provisórios
Como se sabe, nem todos os ingressos no sistema carcerário provêm de sentença condenatória com trânsito em julgado. Há aqueles, que em Alagoas, frise-se, ainda são a maioria, presos provenientes de decretação de prisão cautelar.
Durante nossas visitas, apesar de existirem unidades que deveriam se prestar a receber apenas provisórios, identificamos que a regra instituída pelo art. 84 da Lei de Execuções Penais, de separação de presos, não tem prevalecido.
Diante da falta de espaços, por conta da superlotação, e do elevado número de presos provisórios, é, na grande maioria dos casos, inviável a separação.
A prioridade dos gestores das unidades prisionais superlotadas tem sido evitar conflitos entre os presos, privilegiando-se assim, o convívio na hora de abriga-los no sistema.
Neste aspecto, importa frisar, tais conflitos, que podem inclusive desaguar em rebeliões, infelizmente, diante do cenário, não são mais permitidos ao Estado evitar. Aos presos, a deflagração de rebeliões, aqui em Alagoas ou em qualquer oura unidade da federação, na imensa maioria das unidades prisionais, não é mais uma questão de oportunidade, mas de conveniência.
Como destacamos nos relatórios em anexo, os presos recém-ingressos, condenados ou provisórios, são colocados na triagem dos módulos onde serão “avaliados” pelos demais. Caso nenhum dos “veteranos” se manifeste contra, o preso é inserido no módulo.
Nessa “avaliação”, obviamente o pertencimento a facções também pesa, mas os gestores das unidades prisionais procuram não destacar essa condição para que não se fortaleça alguma espécie de “status” na população carcerária.
Sugere-se, por oportuno, que sejam emitidas recomendações às gerências das unidades prisionais para que, tanto quanto possível, na separação dos presos, seja atendido com prioridade o critério da separação conforme estabelece a Lei de Execuções Penais, especialmente em se tratando de acusados ou condenados por crimes sexuais.
No mesmo sentido, sugere-se que seja encaminhado expediente para o Presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas para que seja formulada recomendação aos juízos criminais (dos processos de conhecimento e de execução penal) do Estado no sentido de orientá-los a:
a) se articularem periodicamente junto à Superintendência Penitenciária para que saibam, antes da decisão de custódia cautelar, se há vagas para presos provisórios disponíveis no sistema e em quais condições seria ele abrigado;
b) avaliarem como prioridade, caso realmente haja necessidade de uma cautelar restritiva para a preservação da persecução penal, a possibilidade de monitoramento eletrônico, como substitutivo da prisão;
c) avaliarem, caso realmente haja necessidade de uma cautelar restritiva para a preservação da persecução penal, a possibilidade de prisão domiciliar, inclusive com monitoramento eletrônico, como imperativo de respeito à dignidade humana.
1.3.2. LGBT
A presença de pessoas privadas de sua liberdade com orientação sexual que foge aos padrões ditados pela maioria da sociedade, pelo que observamos e colhemos dos servidores nas visitas, não é uma constância, mas, obviamente, existem.
Contando-se com essa possibilidade, aliado ao estigma que os acompanham numa sociedade ainda muito preconceituosa, aos que tem a coragem de se declarar ou apresentam sinais visíveis dessa opção sexual, segundo as informações dos servidores do sistema, há uma preocupação com a separação, mas existem módulos que aceitam sem problemas a presença deles no seu convívio, conforme fizemos constar nos relatórios em anexo.
Vale destacar ainda que, no Presídio Baldomero Cavalcante, fomos informados de que dias antes havia ocorrido a oficialização de uma união homoafetiva entre dois presos, conforme descrevemos nos relatórios anexos, o que de certa forma demonstra que há por parte dos gestores das unidades uma preocupação com a dignidade sexual desses presos.
1.3.2. Crimes sexuais
Como constatamos, atualmente alguns acusados e condenados por crimes sexuais são abrigados no sistema, que, segundo os gestores das unidades prisionais, são separados dos demais.
Apesar disto, há módulos que aceitam a presença dessas pessoas sem problemas, como é, em geral, o caso dos módulos constituídos de presos que trabalham.
1.3.3. Tipos de infração
Tal como no caso do item 1.3.1. a separação pelo tipo de infração não tem sido prioridade e, portanto, dificilmente é feita, o que se constitui como grave violação das disposições da Lei de Execuções Penais, razão pela qual adotamos aqui as mesmas considerações já feitas alhures.
1.3.4. Facções
Constatamos nas unidades integrantes do Primeiro Comando da Capital – PCC, da Firma, organização genuinamente alagoana, tida como uma espécie de prestadora de serviços da primeira, e do Comando Vermelho.
Apesar de não fazerem referências às facções no trato com os presos, para que não se fomente certo “status”, há uma preocupação dos gestores do sistema para que não sejam gerados conflitos entre essas organizações criminosas quando misturados seus integrantes.
Como se verifica dos relatórios acostados, os presos “novatos” ficam um período de “aclimatação” junto aos módulos que se pretende coloca-los, no caso do Cyridião Durval, por exemplo, num espécie de triagem anexa ao módulo. Se nenhum dos “veteranos” do módulo se opuser durante esse período, o “novato” é introduzido no módulo.
1.3.5. Deficientes físicos
Encontramos apenas um preso portador de deficiência física durante as visitas técnicas, na casa de custódia, usuário de cadeira de rodas. Segundo apuramos com os gestores das unidades, a presença de pessoas com deficiência não é comum, mas há preocupação com adaptações para que possam exercer os mesmos direitos e cumprir os mesmos deveres que os demais.
Na prática, só vimos uma unidade com preocupação explícita nesse sentido, o Núcleo de Ressocialização, inclusive com banheiro adaptado para portadores de necessidades especiais.
Nesse sentido, sugere-se que sejam encaminhados ofícios às entidades que cuidam diretamente dos interesses dos portadores de deficiência física para que se articulem, junto com a Ordem dos Advogados do Brasil, e com os gestores do sistema carcerário a fim de fazerem levantamento de presos com deficiência física e elaborar conjuntamente uma política estadual de atendimento das demandas que um preso nessas condições requer quando ingresso.
1.3.6. Idosos e pacientes do Centro Psiquiátrico
Não nos deparamos com muitos presos idosos, a grande maioria é composta por jovens e adultos. Sugere-se que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades prisionais para que observem as necessidades especiais que são impostas diante de presos com mais de 60 anos.
Percebemos durante as visitas, presos com idade avançada no Centro Psiquiátrico, onde se encontram pacientes com mais de 30 (trinta) anos na unidade, o que nos parece grave violação de preceito constitucional e legal.
A esse respeito sugere-se que sejam encaminhados expedientes às autoridades competentes para que realizem as modificações que atendem ao pleito antigo de movimentos antimanicomiais, já reconhecidos na Lei 10.216/2001, na Portaria nº 94/2014 do Ministério da Saúde, e na Portaria Interministerial MJ/MS nº 01/2014.
1.3.7. Estrangeiros
Durante nossas visitas só nos deparamos com um preso estrangeiro, de origem Tcheca, no módulo denominado de “cristão”, do Presídio Cyrirdião Durval, conforme descrevemos nos relatórios anexos.
O problema, nesses casos, não apenas em Alagoas[5], é a deficiência na comunicação com o preso, como pudemos constatar.
Sugere-se que seja encaminhado expediente aos gestores do sistema carcerário, tanto local quanto nacional, estimulando a articulação para que mantenham um núcleo com servidores capazes de falar basicamente inglês e espanhol, além de se dedicar, nos casos em que houver necessidade, a firmar convênio com instituições de ensino de outras línguas.
1.4. Revistas
Um dos principais focos de tensão entre familiares dos presos e os gestores do sistema carcerário é a revista manual, mais precisamente a forma degradante como ela é levada a cabo.
A prática da revista manual é generalizada nas unidades prisionais de Alagoas, sobretudo diante da falta de equipamentos de segurança, conforme descreveremos mais detalhadamente no item 1.6.
Preocupa-nos essas práticas, de maneira especial a revista manual em crianças e a possibilidade delas presenciarem as revistas manuais realizadas nos familiares. Segundo todos os servidores com os quais conversamos, as revistas em crianças são feitas na presença dos responsáveis.
É imprescindível que os gestores do sistema carcerário façam coro junto ao Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, tal como sugerido abaixo (item 1.6), com vistas a adquirir equipamentos, tais como scanners e detectores, que extingam as formas de revistas manuais utilizadas hoje. E, caso realmente haja a necessidade de revista manual, que esta seja feita, de forma sempre respeitosa, no preso.
Sugere-se, portanto, encaminhe-se expediente ao conselho tutelar da região das unidades prisionais, solicitando que em dias de visitas haja sempre um conselheiro para acompanhar as revistas em crianças e adolescentes, quando estritamente necessárias, evitando-se notícias de eventuais abusos.
Sugere-se que sejam ainda encaminhados expedientes aos gestores do sistema carcerário orientando que as crianças ou adolescentes não sejam levadas a presenciar as revistas manuais que eventualmente precisem ser feitas em seus familiares.
Por fim, sugere-se que se encaminhe expediente aos gestores do sistema carcerário alagoano reforçando a necessidade de se respeitar a Resolução nº 09/2006[6] emitida pelo Conselho Nacional de Políticas Criminais e Penitenciárias – CNPCP, que disciplina as revistas, deixando-se as revistas manuais para casos extremos.
Sugere-se, por fim, que seja encaminhado expediente para os gestores do sistema carcerário orientando-os a adoção do sistema de agendamento de visitas pela internet, dando mais celeridade ao processo de verificação de identidade em dias de visita.
Prefira-se, desta forma, como já frisamos, a revista aos presos após as visitas, ao invés de revistas degradantes às famílias (e aos próprios funcionários), que, muitas vezes, acabam se afastando do estabelecimento penal, portanto, do preso, por medo ou vergonha do tratamento que podem receber antes de vê-lo.
Como se sabe, no processo de ressocialização, a sensação de pertencimento à família, e a participação da mesma é de extrema importância para o preso, não podendo o Estado permitir que, com seu comportamento, haja o seu afastamento.
1.5. Parlatórios
É imprescindível o contato do preso com seu defensor (art. 5º, inciso LXIII, da CF/88). O advogado é indispensável à administração da justiça (art. 133 da CF/88). O processo não se finda com o trânsito em julgado da condenação criminal, mas tem seu curso durante a execução penal, como já afirmava Francesco Carnelutti, em “As misérias do processo penal”.
Mas para isso, é preciso que ambos (preso e seu defensor técnico) tenham condições de conversar sem barreiras tais como os vidros ou grades que geralmente separam advogado e cliente nos parlatórios do sistema carcerário alagoano.
O desenho atual dos parlatórios acaba impossibilitando, inclusive, que o defensor avalie até mesmo as condições físicas de seu cliente, sobretudo naqueles cuja iluminação é precária, como é o caso do que encontramos nos Presídios Cyridião Durval e Baldomero Cavalcante.
Sugere-se, portanto, que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades para que o atendimento jurídico aos presos seja realizado nas salas para advogados mantidas pela Ordem em cada unidade prisional.
Assim, como forma de garantir dois itens importantes, a segurança e a privacidade, sugere-se que seja adotado o modelo que encontramos no Presídio Feminino Santa Luzia, cuja porta de vidro permitia as duas coisas.
Sugere-se ainda que a Ordem faça um levantamento periódico, por intermédio de comissão específica, das deficiências atualmente existentes nas referidas salas para advogados, tornando-as ambientes sempre dignos do exercício da profissão.
Por fim, sugere-se que seja feito contato institucional com a Superintendência Penitenciária para que seja disponibilizada uma sala para advogados no Presídio do Agreste. 
1.6. Segurança
Detectamos deficiência quanto ao controle do fluxo de pessoas no interior das unidades.
A precariedade da estrutura, aliada à falta de servidores suficientes para dar conta da demanda diante da superlotação, são os principais ingredientes que levam à fragilidade da segurança, tanto dos presos quanto dos servidores.
Primeiro que, conforme já dissemos alhures, o controle do fluxo de pessoas é basicamente feito de forma manual, com anotações em papeis, com a exceção do Presídio do Agreste, dificultando a articulação de informações e a detecção de pessoas que não poderiam nem deveriam ter acesso às unidades.
Segundo que, existem unidades que sequer contam com bloqueadores de sinal para celulares ou similares, portais detectores de metal, scanners, raio-x ou até mesmo câmeras de vigilância.
Nesse particular, a unidade que se apresenta em piores condições é o Presídio de Segurança Máxima, conforme descrevemos nos relatórios anexos, inaugurado há cerca de dois anos, atualmente conta apenas com detectores de metal portáteis. A máquina de raio-x, os bloqueadores de sinal de celular e os portais detectores, no momento de nossa visita, estavam danificados.
Sugere-se, que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades, bem como ao Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, cobrando a articulação entre eles para que, com recursos do Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN, seja realizado processo licitatório com a finalidade de adquirir todos os equipamentos necessários para suprir a deficiência atualmente existente em termos de segurança, problema que acaba colocando em risco, especialmente os servidores que operam o sistema.
Sugere-se ainda que se recomende a contratação, também com os recursos do Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN, mediante convênio com o órgão já indicado acima, uma empresa especializada na manutenção e conserto dos referidos equipamentos, para que não haja por longo período a interrupção do funcionamento dos imprescindíveis serviços.
Ademais disso, sugere-se ainda que se recomende aos gestores das unidades que, no trato com os presos no interior das unidades, utilizem-se armamentos não letais, como hoje ocorre no Presídio do Agreste, que deverão ser adquiridos da mesma forma que os demais equipamentos de segurança.
Ainda na esteira da preocupação com a segurança, não apenas dos presos, mas também dos servidores, cumpre-nos destacar que é imperioso que o Estado faça valer as disposições da Lei 11.900/2009, que prevê a possibilidade de realização de interrogatório e outros atos processuais por sistema de videoconferência.
Além de possibilitar maior segurança, é menos custoso aos cofres públicos, que deixará de mobilizar todo o aparato de servidores no deslocamento do preso.
Sendo assim, sugere-se que sejam encaminhados expedientes ao Presidente de Tribunal de Justiça e aos gestores das unidades prisionais para que se articulem no sentido de, junto ao Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, com recursos do Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN, adquiram toda a estrutura necessária para a instalação de um centro de videoconferência no complexo prisional da Capital, bem como no Presídio do Agreste e no fórum da Capital, onde a demanda é maior.
1.7. Servidores
É urgente a necessidade de realização de concurso público para suprir as deficiências atualmente encontradas, assim como também é urgente a implantação de um plano de cargos e salários. Não bastasse a quantidade insuficiente de servidores disponíveis, especialmente agentes, alguns dos que exercem seus cargos deixam de comparecer a seus postos por inúmeras razões: doenças e faltas injustificadas têm sido as mais comuns, segundo apuramos nas visitas.
Sendo assim, sugere-se que seja encaminhado expediente aos gestores do sistema carcerário para que: deflagre-se com a máxima urgência processo seletivo para suprir a necessidade existente; apure-se com celeridade e rigor as faltas injustificadas de servidores no sistema; elaborem-se e executem-se políticas de valorização (o plano de cargos e salários já seria um passo) e capacitação permanentemente dos servidores, inclusive com suporte médico e psicológico.     
II – CONTROLE DO FLUXO INTERNO
Neste tópico, a intenção é a de avaliar de que forma o ente responsável pela privação da liberdade procede no trato com o sujeito no interior do sistema carcerário. O trato com o encarcerado no interior do sistema é elemento de extrema importância para dissipar as tensões naturalmente surgidas com esse tipo de interferência na liberdade alheia.
Proporcionar, portanto, vias que, além de atender aos requisitos legais e constitucionais, servirão como “válvulas de escape” para os presos é de fundamental importância para o regular funcionamento do sistema. 
2.1. Inspeções
Tal como previsto atualmente na Lei de Execuções Penais as visitas de autoridades dos órgãos de execução penal ao sistema carcerário são realizadas de forma separada, ou seja, cada uma faz a sua de forma independente.
Segundo as informações que tivemos de servidores, são constantes as presenças do juiz das execuções penais, bem como a do representante do Ministério Público no sistema carcerário, mas o Conselho da Comunidade e a Defensoria Pública apresentam deficiência nesse particular, segundo constatamos nas visitas, especialmente no complexo prisional da Capital.
Apesar de em nenhuma das visitas nas unidades termos nos deparado com Defensor Público, é preciso reconhecer que a Superintendência Penitenciária tem advogados contratados para dar assistência aos presos, conforme observamos.
O Conselho da Comunidade não é presença constante, segundo um de seus membros com quem conversamos, a falta de recursos é um dos fatores que não permite um trabalho mais eficiente junto ao sistema carcerário.
A Defensoria Pública, importante órgão no acompanhamento dos processos de presos sem advogados, como dissemos, também não tem constância nas unidades prisionais, com a exceção do Presídio do Agreste, desvirtuando os ditames do art. 16 da Lei de Execução Penal.
As inspeções ao sistema precisam ser feitas em conjunto com todos os representantes dos órgãos parceiros do sistema de execução penal. A iniciativa evita que autoridades dos órgãos hoje competentes pela fiscalização não procedam como deveriam, ou seja, a pretexto de fazer suas inspeções restrinjam-se apenas a uma visita de “cortesia” às dependências da administração das unidades prisionais, sem que tenham verificado as condições das celas e demais dependências da unidade.
Assim sendo, sugere-se que seja encaminhado expediente a todos os órgãos da execução penal, inclusive aos órgãos parceiros, tais como a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados – APAC, a Ordem dos Advogados do Brasil, a pastoral carcerária e os conselhos da comunidade e penitenciário, para que se articulem no sentido de promoverem um calendário de visitas periódicas e conjuntas no sistema carcerário alagoano.
Sugere-se ainda que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades prisionais estimulando-os a estabelecerem parcerias com instituições de ensino, organizando um calendário de visitas ao sistema, com a intenção de desmistificar o rótulo de presidiário, estimular o debate e o senso crítico sobre o sistema carcerário, aproximando a sociedade da busca por soluções desse grave problema, além de proporcionar vigilância constante de seu funcionamento.
Sugere-se que seja encaminhado expediente ao Governo do Estado orientando-o a dotar o Conselho da Comunidade de recursos mínimos para o seu pleno funcionamento. 
2.2. Trabalho
Como parte de uma limitação constitucional pétrea, nosso país não adota pena de morte, salvo uma única exceção (art. 5º, inciso XLVII, alínea “a”, da Constituição Federal), nem pena de caráter perpétuo (art. 5º, inciso XLVII, alínea “b”, da Constituição Federal).
Sendo assim, trabalha-se no sistema carcerário com a certeza de que o preso voltará às ruas. Para que todo o dinheiro gasto com o encarcerado durante sua estadia nas dependências do sistema não seja em vão, é preciso dotá-lo de capacidade para superar o preconceito e as exigências do mercado de trabalho.
Nessa esteira, o trabalho oferecido ao preso, além de sua utilidade como forma de remição, deve ser útil fora das unidades prisionais, que não apenas sirvam como atividade para retirá-lo do ócio, que também tem sua importância para o funcionamento do sistema, mas não devendo se resumir a isso.
Constatamos que inúmeros presos aguardam para trabalhar e ter a oportunidade de ver sua pena remida, como prevê a Lei de Execução Penal (art. 126).
Não há, portanto, trabalho para todos, havendo lista de espera para gozar desse benefício.
A única unidade que conta com a possibilidade de trabalho para todos os presos que abriga é o Núcleo de Ressocialização, cujo modelo, sugere-se, precisa ser expandido.
Assim sendo, sugere-se que sejam encaminhados expedientes aos gestores das unidades prisionais estimulando-os a fazerem, junto com a Ordem dos Advogados do Brasil, coro junto ao Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, com vistas a oferecerem a estrutura necessária para ampliar a capacidade de geração de vagas de trabalho para a população carcerária alagoana.
Sugere-se ainda que o mesmo expediente solicite ao órgão federal que observe as particularidades regionais do sistema antes de emitirem regras que servirão para todo o país, especialmente para a utilização de programas como, por exemplo, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC.
2.3. Educação
A pedra de toque do desenvolvimento, em todos os sentidos, é a educação. Capacitar as pessoas é item fundamental em todos os países que alcançaram níveis respeitáveis de desenvolvimento no mundo. E aos encarcerados essa preocupação não pode faltar, sobretudo porque a eles se apresenta uma dificuldade ainda maior de competir no mercado de trabalho: o preconceito.
É preciso, pois, portanto, sugere-se, encaminhar expediente aos gestores das unidades prisionais e da educação estadual e municipal, bem como a entidades que fomentam o ensino profissionalizante, estimulando-os a criarem uma estrutura fixa e de qualidade, além de uma carreira específica para professores dentro do sistema carcerário.
Estimular o estudo é importante não apenas pelo fato de servir como remição da pena, mas como instrumento de transformação pessoal e social.
Sugere-se ainda que, estes mesmos órgãos, trabalhem na elaboração de um Plano de Metas para Educação Prisional, visando erradicar, até 2018, o número de presos não alfabetizados no sistema carcerário.
Sugere-se que seja encaminhado ao juízo das execuções penais, expediente no sentido de solicitar que sejam admitidas diferentes formas de remição pelo estudo, inclusive a leitura, conforme Recomendação nº 44/2013 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.
Sugere-se, ainda, que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades prisionais para que procurem parcerias com instituições de ensino à distância, estimulando-as à responsabilidade social.
Assim, espera-se que seja instituído o Programa de Remição da Pena pela Leitura em todos os estabelecimentos penais, mediante, se preciso, aprovação de lei estadual.
Sugere-se, por fim, que os gestores das unidades prisionais estimulem os presos a participarem de processos democráticos, tal como na escolha do representante do módulo, assim como hoje ocorre no Núcleo de Ressocialização, conforme relatamos nos relatórios anexos. 
2.4. Saúde
Zelar pela saúde e observar os direitos de tratamento físico e psicológico dos presos deve figurar como uma das prioridades.
Aqui também há necessidade de trazer o Sistema Único de Saúde – SUS para dentro do sistema carcerário. Atualmente, os profissionais da saúde que trabalham no sistema carcerário alagoano são contratados pela Superintendência Penitenciária, com a exceção do Presídio do Agreste, cujos profissionais estão vinculados à empresa que gere a unidade.
Os espaços para que os profissionais atuem nas unidades, de modo geral, estão em bom estado de conservação, alguns, inclusive, climatizados, e não ouvimos reclamações com relação ao estoque de medicamentos.
No Núcleo de Ressocialização, destaque-se, a sala da saúde não deixa a desejar a qualquer sala de consultório particular da Capital.
Nas unidades existem salas para o atendimento de dentistas, encontrada deficiência apenas na Cadeia Pública, cujo condicionador de ar estava quebrado. Os principais serviços oferecidos são extração e obturação.
Há ainda preocupação com a presença de doenças como AIDS, tuberculose, diabetes, hipertensão, entre outras, inclusive doenças de pele. Nas visitas encontramos presos fazendo testes rápidos para a detecção de algumas dessas doenças e sendo vacinados contra hepatite e outras doenças, como consta nos relatórios em anexo.
A esse respeito, sugere-se que seja encaminhado expediente para os gestores da saúde estadual e municipal estimulando-os a criar carreiras específicas para todos os profissionais da saúde no sistema carcerário, especialmente médicos, atendendo-se, assim, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP).
Sugere-se ainda que seja encaminhado expediente aos gestores das unidades prisionais orientando-os a: seguir o manual do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN de intervenções ambientais para o controle da tuberculose nas prisões[7]; promover medidas preventivas contra a transmissão do vírus da AIDS, inclusive com a distribuição de camisinhas durante as visitas íntimas; intensificar a realização de exames para detecção e tratamento de doenças infectocontagiosas.
Sugere-se ainda que seja encaminhado expediente ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado para que oriente os juízos criminais a observarem, antes de promoverem transferências de presos entre as unidades, se os mesmos se encontram em processo de tratamento de doenças como a AIDS e a tuberculose, cuja interrupção do tratamento pode gerar grave prejuízo à saúde do preso. 
Faz-se necessário, pois, encare-se como uma sugestão, com vistas a dar mais efetividade no tratamento, transferir imediatamente a gestão do manicômio judicial para a Saúde, na forma determinada pela Portaria nº 94, de 14.01.2014, do Ministro da Saúde, pela Portaria Interinstitucional MJ/MS nº 01/2014 e da Lei nº 10.216, de 06.04.2001 (Lei Antimanicomial – Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001).
2.5. Lazer
Atividades recreativas tais como musculação, futebol, xadrez, música, e até mesmo o artesanato, entre outras, devem se inserir nas estratégias de controle do fluxo interno do sistema. É, pois, importante “válvula de escape” para as angústias a que são submetidos aqueles que se submetem ao sistema carcerário.
Em nossas visitas, vimos que poucas unidades possuem espaço adequado para a prática de esportes, e as que possuem, dada a superlotação e a carência de servidores para acompanhar as atividades, não é utilizada a contento.
As únicas unidades que possuem espaço adequado, e dele se utilizam com constância, é o Núcleo de Ressocialização e o Presídio do Agreste, que contam com a organização de torneios entre os presos.
2.6. Controle de progressão, remição e outras circunstâncias do cumprimento da pena ou prisão provisória
Conforme já dissemos, o sistema de acompanhamento dos dados do preso no sistema apresenta deficiências, o que pode ser sanado com o atendimento das sugestões já feitas no item 1.1. O domínio de tais informações perpassam as três estruturas que nos servem de parâmetro para a confecção do presente relatório.
2.7. Visita íntima
De notada influência no comportamento humano, a atividade sexual é item que não pode ser negligenciado pelas autoridades gestoras do sistema carcerário. Assim, é preciso proporcionar ao encarcerado a oportunidade de encontros íntimos e reservados com seus parceiros (as), ajudando na preservação da identidade familiar.
O direito à livre atividade sexual é uma necessidade humana, e como todo direito, evidentemente, precisa ser regrado, mas jamais vedado, sob pena de gerar tensões desnecessárias e danosas ao bom funcionamento do sistema.
A situação é mais crítica, conforme verificamos, na Cadeia Pública e no Baldomero Cavalcante, onde geralmente o sistema utilizado é o do “come quieto”, ou seja, presos em atividades sexuais com suas parceiras são separados de outros casais geralmente por um lençol.
2.8. Alimentação
Uma das necessidades reais e imprescindíveis do ser humano é a alimentação. O direito à satisfação da fome, ao acesso e utilização dos recursos naturais, a uma alimentação saudável, assegurar condições aceitáveis de nutrição é dever inegociável do Estado sobre os encarcerados.
Como se sabe, o metabolismo tem influência direta no bem estar do corpo que, carente dos nutrientes indispensáveis para o seu regular funcionamento e desenvolvimento, acaba gerando reações indesejadas para o próprio sistema, com tensões que podem desaguar em conflitos sérios.  
Nesse particular verificamos deficiência, ora na estrutura ora nos alimentos, apesar de encontrarmos nutricionista à disposição.
Na cozinha da Cadeia Pública, por exemplo, o teto sob as panelas se apresentava bastante deteriorado, mas não ouvimos reclamações sobre a comida.
Já no Cyridião Durval, no Baldomero Cavalcanti e no Presídio de Segurança Máxima, servidos pela mesma cozinha, situada na primeira unidade, cuja estrutura se apresentava em condições regulares, ouvimos reclamação sobre a comida.
Sugere-se sejam encaminhados expedientes à vigilância sanitária para que sua presença dentro do sistema carcerário seja uma constante, sobretudo nas cozinhas que funcionam no local, apontando o que pode ser feito para melhorar a qualidade da comida que serve tanto os presos quanto os servidores.
Sobre este aspecto, é preciso ainda que se registre que o controle de acesso às cozinhas é deficiente, com exceção do Presídio do Agreste, conforme fizemos constar do relatório em anexo, com a participação de presos no preparo dos alimentos.
Há, portanto, que se tratar de forma mais rígida o acesso à cozinha, tendo em vista que podem tanto os presos quanto os funcionários ser vítimas de sabotagem, com graves consequências à saúde.
2.9. Liberdade de crença
Proporcionar espaços para a reflexão e integração religiosa é dever do Estado e item fundamental na tarefa de evitar ao máximo o surgimento de tensões danosas ao regular funcionamento do sistema.
Nas unidades são permitidas a realização de cerimônias religiosas e, segundo constatamos, a presença mais constante nas unidades é de líderes de igrejas evangélicas.
III – CONTROLE DO FLUXO DE SAÍDA
Neste tópico, a intenção é a de avaliar de que forma o ente responsável pela privação da liberdade procede para que o sujeito saia do sistema carcerário.
3.1. Mutirões automáticos e temáticos
Sugere-se, portanto, diante do quadro de superlotação já existente, a realização de Mutirões Jurídicos Temáticos, com metodologia uniforme, e calendário a ser discutido e aprovado pelos órgãos da execução penal, destacando-se: presos provisórios, mulheres, presos por crimes não violentos, dependente/microtraficante com pequena quantidade de droga, idosos e estrangeiros, portadores de doença mental ou de doença contagiosa.
Uma vez equacionado o problema, a ideia, já acolhida pela proposta de reforma da Lei de Execução Penal (PLS 513/2013), é a de que se realizem mutirões automaticamente, assim que a capacidade do estabelecimento penal for superada.
3.3. Estímulo para a utilização do monitoramento eletrônico
Tal instrumento já vem sendo utilizado nos Estados Unidos desde a década de 80. Diante do quadro de superlotação, da demanda sempre constante por mais vagas, e, principalmente, da inexistência de regime semiaberto, nos moldes do determinado pela Lei de Execução Penal, a busca por alternativas à privação da liberdade no sistema carcerário é uma necessidade.
Nesse sentido, o monitoramento eletrônico é uma alternativa, sobretudo se, caso necessário, aliado à prisão domiciliar. A esse respeito, já fizemos sugestão no item 1.1.
3.4. Documentos para os presos
Providenciar os documentos de cidadania para todos os presos é uma obrigação do Estado que tutela sob sua responsabilidade a liberdade alheia.
No sistema carcerário alagoano há, no complexo prisional localizado na Capital, um balcão cidadão, que tem por finalidade auxiliar os gestores das unidades prisionais na busca da documentação dos presos.
É imperioso, portanto, intensificar a política de expedição de documentos de cidadania: número único da certidão de nascimento, RG, CPF, Carteira de Trabalho e Título de Eleitor, articulando com cada Órgão competente na União ou nos Estados a emissão destes documentos (Gestores prisionais, Cartórios Extrajudiciais via CNJ, Ministério do Trabalho, Ministério da Fazenda, Tribunal Regional Eleitoral).
3.5. Saídas do preso
É muito comum, no sistema carcerário alagoano, verificarmos presos em saída temporária, ou sendo levados a audiências, julgamentos e tratamento de saúde, com a farda do estabelecimento penal, o que acaba causando impacto negativo aos que com ele se deparam, trazendo certo prejuízo a sua defesa e à ressocialização.
Portanto, sugere-se que sejam encaminhados expedientes aos gestores das unidades prisionais no sentido de providenciarem vestimentas, que não o fardamento da unidade, adequadas para o preso quando necessita sair temporariamente.
IV – CENTRO PSIQUIÁTRICO
A respeito desta unidade, é preciso uma especial atenção. Verificamos pessoas que conta com mais de vinte anos de internação, uma, em particular, conta com mais de trinta, o que certamente viola qualquer regra constitucional de limites à execução penal.
Sugere-se que sejam encaminhados expedientes aos gestores do sistema carcerário alagoano, ao Tribunal de Justiça, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, bem como aos demais órgãos parceiros na execução penal, provocando-os a se articularem, junto com a Ordem dos Advogados do Brasil, na busca por soluções desse grave problema de violação aos direitos humanos.   
V – CONSTRUÇÃO DE NOVAS VAGAS
Segundo constatamos, o Estado já está em processo de construção de mais vagas no sistema carcerário.
Ocorre que, é importante, antes de iniciar efetivamente a construção, ouvir os órgãos envolvidos na execução penal, tais como o juízo das execuções, o Ministério Público, a Defensoria, a OAB, os conselhos, os servidores, enfim, todos os que, de uma forma ou outra, podem contribuir para evitar que sejam construídas novas vagas com “velhos” problemas ou vícios.
Assim, sugere-se que, sempre que se pretender realizar a construção de novas vagas, seja realizada uma audiência pública a fim de colher sugestões dos principais atores e parceiros da execução penal.
VI – PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA
Antes de emitirmos juízo de valor sobre a possibilidade jurídica dessa parceria, hoje muito discutida entre especialistas, é preciso reconhecer que, mesmo não sendo perfeito, o Presídio do Agreste, gerido internamente pela empresa Reviver[8], é de longe o que melhor atende as principais determinações da Lei de Execuções Penais brasileira no âmbito do sistema carcerário alagoano.
O Núcleo de Ressocialização também serve como modelo, mas com uma diferença: ele escolhe no âmbito de um processo seletivo, os presos que não tem perfil de gerar conflitos no cumprimento da pena, o que não é permitido ao Presídio do Agreste, que recebe os presos que para lá são encaminhados pela autoridade judiciária.
Apesar disso, diante das inúmeras objeções que a doutrina brasileira especializada no assunto tem levantado sobre tais parcerias, a principal delas é a transferência da gestão da execução penal a funcionários terceirizados (descrevemos no relatório em anexo), é preciso que o Estado mantenha-se aberto a aprimorar o sistema atualmente vigente no Presídio do Agreste.
Penso que, a priori, o investimento com empresas particulares para a gestão do sistema prisional, poderia também ser destinado com vistas nos servidores efetivos, que, caso recebessem a estrutura nova entregue à empresa que gere o Presídio do Agreste, poderiam desempenhar as mesmas atividades.
Quanto à possibilidade jurídica da parceria nos moldes da que atualmente é mantida entre o Estado e a empresa Reviver no Presidio do Agreste, a matéria já foi motivo de recentíssima deliberação do Poder Judiciário no Estado de Minas Gerais[9], tendo sido provocado pelo Ministério Público, em cuja conclusão no acórdão destaca-se:
“Portanto, declaro a nulidade da intermediação de mão
de obra realizada pela PPP, tornando nulas as contratações dos
empregados admitidos irregularmente, determinando a substituição dos mesmos por servidores públicos, mediante a realização de concurso  público, no prazo de 365 dias, sob pena de multa diária no importe de R$10.000,00, a ser aplicada ao primeiro e segundo réus, multa esta a ser revertida ao FAT. O Estado deverá se abster de realizar novos contratos ou aditivos contratuais com pessoa física ou jurídica para atuar na administração das unidades prisionais, sob pena de multa
diária no valor de R$ 500.000,00, por contrato celebrado ou aditivo contratual, valor este também reversível ao FAT”.
31ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG.  Processo n° 000750-71.2011.503.0110. Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Réus: ESTADO DE MINAS GERAIS e GPA GESTORES PRISIONAIS ASSOCIADOS S/A. Publicação: 19/03/2014 às 17:21 h. 

Não bastasse isso, deve-se observar ainda a Resolução nº 08/02 do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP[10], que aduz:

Art. 1º Recomendar a rejeição de quaisquer propostas tendentes à  privatização do Sistema Penitenciário Brasileiro.

Art. 2º - Considerar admissível que os serviços penitenciários não relacionados à segurança, à administração e ao gerenciamento de unidades, bem como à disciplina, ao efetivo acompanhamento e à  avaliação da individualização da execução penal, possam ser executados  por empresa privada. (grifo nosso)

Nesse sentido, sugere-se que seja encaminhado expediente ao Governador do Estado estimulando-o a realização de audiência pública para discutir o assunto.
Ademais, é imperioso que seja encaminhado expediente aos gestores do Presídio do Agreste, especialmente à Superintendência Penitenciária, para que se adote procedimento em consonância com o art. 41 da Lei de Execuções Penais que, dentre outras coisas, garante ao preso ser identificado pelo nome e não por um número, como descrevemos no relatório em anexo.
Ainda sobre o Presídio do Agreste, sugere-se que seja encaminhado expediente ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado para que oriente os juízos criminais em não encaminhar para a referida unidade prisional, presos além de sua capacidade, respeitando-se assim, seu bom e regular funcionamento.
Faz-se necessário ainda que, seja encaminhado ao Governador do Estado expediente solicitando agilidade na disponibilização de investimentos em abastecimento de água e energia (neste caso, em parceria com a Eletrobrás), em todas as unidades prisionais, especialmente no Presídio do Agreste.
VII – MODIFICAÇÕES LEGISLATIVAS
Boa parte dos investimentos financeiros em execução penal fica sob a responsabilidade do Governo Federal, através do Fundo Penitenciário Nacional, razão pela qual, é importante estimular a bancada federal do Estado a se empenhar na realização de ações que visem facilitar o repasse dos necessários recursos.
Há no Senado da República, projeto de lei (513/2013) que intenciona modificações na Lei de Execução Penal (7.210/1984).
Nesse sentido, sugere-se encaminhar expediente aos representantes do Estado no Congresso Nacional, especialmente ao Senador Renan Calheiros, Presidente do Senado, solicitando que se empenhem na construção de soluções para os graves problemas atualmente encontrados no sistema carcerário local, sobretudo com o acolhimento das alterações propostas pela Ordem dos Advogados do Brasil, através da Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário – COASC, no PLS 513/2013, que modifica a Lei de Execução Penal.
Sem mais para o momento, certo de que todas as providências cabíveis serão prontamente adotadas com o fim de evitar o agravamento do problema que, em persistindo, constitui-se em flagrante violação da dignidade da pessoa humana, elevamos voto de estima e distinta consideração.
Maceió, 05 de maio de 2014.

Francisco de Assis de França Júnior
Advogado inscrito na OAB/AL sob o nº 7315 – Representante de Alagoas na Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário – COASC, criada pela Portaria nº 11 de 16 de janeiro de 2014 do Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil



[1] Disponível em: http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={E9614C8C-C25C-4BF3-A238-98576348F0B6}&BrowserType=NN&LangID=pt-br&params=itemID%3D%7BA5701978%2D080B%2D47B7%2D98B6%2D90E484B49285%7D%3B&UIPartUID=%7B2868BA3C%2D1C72%2D4347%2DBE11%2DA26F70F4CB26%7D. Acesso em: 06 de abril de 2014.
[2] Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/pedrinhas-o-maranhao-e-a-tragedia-carceraria-brasileira-3435.html. Acesso em 01 de abril de 2014.
[3] Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/os-presos-no-comando. Acesso em 01 de abril de 2014.
[4] Disponível em: http://sistemacarcerariooab.blogspot.com.br/2014/03/carta-conjunta-aprovada-apos-revisao.html. Acesso em: 06 de abril de 2014.
[5] Disponível em: http://g1.globo.com/brasil/noticia/2010/06/lingua-e-habitos-culturais-complicam-vida-de-presos-estrangeiros.html. Acesso em: 09 de abril de 2014.
[6] Disponível em: http://www.criminal.caop.mp.pr.gov.br/arquivos/File/ExecucaoPenal/CNPCP/n9de12jul2006.pdf. Acesso em 16 de março de 2014.
[7] Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_intervencoes_ambientais_controle_tuberculose_prisoes.pdf. Acesso em: 08 de abril de 2014.
[8] Disponível em: http://reviverepossivel.com/. Acesso em: 01 de abril de 2014.
[9] Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/sites/default/files/Edi%C3%A7%C3%A3o%2022%20do%20Brasil%20de%20Fato%20MG.pdf. Acesso em: 01 de maio de 2014.
[10] Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/sistema-prisional/resolucoes/8-2002-conselho-nacional-de-politica-criminal-e-penitenciaria. Acesso em: 01 de maio de 2014.