A Lei 12.737/12, discutida e aprovada pelo Congresso
Nacional impulsionado pela repercussão da subtração e divulgação das fotos
íntimas da atriz Carolina Dieckmann, insere em nosso Código Penal o art. 154-A,
trazendo à tona mais uma confirmação do conhecido adágio “a pressa é inimiga da
perfeição”.
A criminalização está baseada no acesso a
qualquer tipo de equipamento eletrônico alheio, que armazene informação, conectado
ou não à internet, burlando indevidamente mecanismos de segurança, com a
intenção de obter, modificar, destruir dados ou informações sem a anuência do
titular do equipamento acessado ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem
ilícita.
Desse modo, com uma leitura superficial,
mas atenta, de um diligente operador do Direito Penal, conclui-se que em
situações em que a invasão se der em computadores com mecanismos de segurança
desabilitados ou inexistentes, o fato será atípico, impossibilitando-se a
responsabilização penal por falta de perfeita adequação típica. Ou seja, os que
mais necessitam de proteção, ficaram desguarnecidos!
Mas este certamente não é o único óbice
de atendimento das finalidades que originaram essa lei, prontamente aprovada
sob a influência dos holofotes midiáticos.
Em nossa rápida análise sobre o novo
modelo de conduta proibida prescrito em nosso ordenamento, e após consulta às
opiniões de doutrinadores renomados como Alice Bianchini e Luiz Flávio Gomes, devemos
chamar a atenção ainda para o fato de nos depararmos atualmente com uma quantidade
considerável de pessoas que adotam posturas de auto colocação em perigo.
Paradigmático, nessa linha de raciocínio, é o caso
do jovem médico de Mato Grosso que, tendo ingerido bebidas alcoólicas em sua
festa de formatura, após ter mergulhado espontaneamente na piscina
disponibilizada no local, acabou sendo encontrado morto. Entendeu o Superior
Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 46.525-0 (link para o inteiro teor do acórdão aqui mesmo no blog), de relatoria do Ministro
Arnaldo Esteves Lima, que a comissão de formatura, denunciada pela morte, não
podia ser responsabilizada penalmente por (dentre outros argumentos) ter sido o
próprio jovem que se colocou em risco naquelas circunstâncias.
Situações como essas, não justificam a incidência da norma penal por total ausência de tipicidade material (elemento indispensável para a configuração do crime), consagrada nas teses de Roxin, Zaffaroni e do próprio Luiz Flávio Gomes.
O que dizer então daqueles que cotidianamente
clicam em links enviados por pessoas alheias ao seu convívio? E o que dizer
daqueles que não se preocupam em instalar e atualizar o antivírus? É preciso
reconhecer que grande parte das invasões nesses equipamentos é realizada com o
auxílio direto das vítimas que, frequentemente, permitem, com esses cliques, a ofensa.
Há, assim, uma clara linha de defesa para atipicidade do fato por conta da postura
negligenciada das supostas vítimas.
É certo que ao Estado compete a tarefa de
tutelar os bens importantes para a manutenção da paz social, mas nós,
detentores desses bens jurídicos, devemos também assumir a incumbência de não
gerarmos situações que criem riscos relevantes de ofensa.
Encontramos, nessa apertada análise, situações que
podem levar a ausência de responsabilização penal. Muitas dessas situações que
levam a atipicidade da conduta surgem de nossa falta de cuidado e, sobretudo, da falta de cuidado de nosso legislador
na construção do tipo penal.
Assistimos, como temos sustentado neste espaço, um
Direito Penal regido pelas emoções do momento, com pouco espaço para a
serenidade.
Importa lembrar, por fim, que Maria da Penha, homenageada
com o nome da lei contra violência doméstica (11.340/06), precisou recorrer à
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, sediada em Washington, para que o
Estado brasileiro atuasse na construção de uma legislação sobre o assunto. Entre
o drama vivenciado por ela (espancamento e tentativa de homicídio) e a lei,
quase duas décadas se passaram. Nada comparado com o caso da atriz Carolina
Dieckmann, onde o Congresso, embalado pela exposição midiática, foi célere e
desproporcional, conforme vimos.
Boa análise professor
ResponderExcluirVisivelmente é perceptível a aprovação desta lei sem nenhum estudo específico sobre a área, na qual, foi aprovada pelo clamor popular. Além disso, não sendo realizada cautelosamente o estudo referente ao verbo invadir, nesse caso, generalizou e incluiu os profissionais de Sistema da Informação que trabalham com o intuito contrário ao crime. Ressalvando que, a ausência de informação e "educação" digital, bem lembrado acima, contribui aos inúmeros crimes realizados no mundo virtual, na qual, é necessário adequar-se as novas ferramentas de uso da sociedade.
ResponderExcluirÓtimo texto professor!
Abraços,
Carlos Ferreira
Obrigado, querido amigo!
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