A responsabilização penal é tema bastante discutido ao longo
da história do Direito Penal no mundo. Homens, mulheres, crianças, e nem mesmo
os animais, escaparam dessa discussão na construção do critério que utilizamos
hoje.
Imputar a alguém as consequências de uma infração penal é
tarefa que exige um esforço hercúleo do moderno operador do Direito. Ter as
normas jurídicas como parâmetro, agregando elementos filosóficos, políticos,
principiológicos, entre outros mecanismos que respeitem efetivamente os
direitos humanos, é o dever de qualquer magistrado antenado com essa nova era.
A era das garantias!
Foram séculos de repressão, suplícios e autoritarismos, até
alcançarmos os limites estabelecidos hoje nos Estados Democráticos de Direito.
Limites não apenas aos cidadãos, recorde-se, mas especialmente ao Estado no
exercício de seu pode punitivo. Pela importância que possuem, por resguardar a
dignidade humana e tudo que dela se abstrai, as garantias até aqui conquistadas
só podem ser objeto de ampliação e otimização. Isso é fórmula corrente na
literatura constitucionalista e internacionalista.
Observamos com preocupação as vozes que se levantam pregando
a redução da maioridade penal como a panaceia da crescente criminalidade no
país, sempre que a mídia alça à categoria de “celebridade” algum inimputável.
Mudar a realidade com uma canetada, sem atacar a causa (com
políticas afirmativas em educação e saúde, por exemplo), é, na prática, o que
pretendem. Ora, nem mesmo a pena de morte foi capaz de intimidar
significativamente a prática delitiva (basta verificar as experiências de
muitos estados norte-americanos), por que razão a redução da maioridade penal o
faria? O que vem depois se verificarmos a insuficiência dessa providência? Execuções
e suplícios públicos, como os relatados por Foucault em seu “Vigiar e punir”?
Opiniões abalizadas, de juristas de tradição e respeito,
mas, com a permissa vênia, em nosso sentir, influenciadas pelo “clamor” da
sociedade leiga. Em um exercício de comparação, algo como querer curar uma forte
gripe receitando mais lenços ao paciente, quando o correto seria identificar e combater
as causas e, assim, evitar o agravamento e a contração de novo resfriado.
Não precisa ser profundo conhecedor da matéria para saber
que tipo de efeito prático o atendimento a esse capricho trará: o incremento populacional
nas já superlotadas penitenciárias.
Poderíamos traçar uma série de justificativas baseadas na
psicologia, na sociologia, na antropologia, na criminologia, enfim, em tantas
outras ciências para justificarmos nosso ponto de vista, mas nos basta, por
hora, o argumento técnico-jurídico.
É falacioso o argumento de que aos menores de dezoito anos
nenhuma consequência lhes é imposta por força de uma infração. Há consequência
sim! Obviamente não aquelas devidas aos maiores, mas as consequências existem.
Mais brandas, é bem verdade, mas daí a fomentar na sociedade a ideia de que o
Estado assume uma postura de completa indiferença para com os menores é, no
mínimo, desconhecimento técnico ou má-fé.
Assusta-nos que a discussão nem passe por uma modernização das
medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, com
mais de vinte anos de existência, mas pela radical diminuição da maioridade
penal.
Como dissemos, nosso argumento é técnico. O que nos poupa um
bom tempo em questões extremamente subjetivas e difíceis de sustentar pela via
do “certo” ou “errado”. A questão não é essa!
A maioridade penal é garantia constitucional (art. 228) aos
menores de dezoito anos contra o poder punitivo estatal, na medida em que
impede o emprego de determinadas punições, as mesmas devidas aos maiores. É
direito dos menores, portanto, serem tratados nos termos da legislação
específica, por estarem em uma categoria com garantias específicas.
Como garantia individual que é, por força do art. 60, §4º,
inciso IV, da Constituição brasileira, não pode ser objeto de alteração por emenda
constitucional, não podendo sofrer supressão. A maioridade penal é modalidade clássica
de cláusula pétrea.
Reforça-se esse argumento pelos tratados internacionais
dos quais o Brasil é parte. A maioridade penal brasileira, a bem da verdade,
segue o padrão internacional. Até mesmo o Tribunal Penal Internacional, criado
pelo Estatuto de Roma, prevê a maioridade para os dezoito anos. Mudar a
maioridade penal é submeter o país às admoestações no âmbito externo, por
descumprir cláusula que se comprometeu a respeitar (pacta sunt servanda).
Como venho sustentando neste espaço, assistimos, muitas
vezes passivamente, ondas involutivas que procuram arrebatar garantias
tradicionalmente existentes em nosso sistema. Cabe-nos, com sobriedade e
paciência, passado o pulso energético de discursos inflamados e sedutores pelas
fórmulas aparentemente infalíveis de combate à criminalidade, alertar para as
consequências dessa postura.
Muito bonito seu discurso.
ResponderExcluirSó que nele você defende o menor e o que a sociedade quer é punição para o marginal.
Menor dorme na rua abandonado enquanto o marginal assalta e queima suas vitimas.
Menor pede na sinaleira, vivem sem escola enquanto o marginal, assalta nas ruas e quando o motorias se assunta ele atira mata e vai para casa dormir.
Portanto, é dado ao marginal a proteção que o menor não tem, da mesma forma que é dado ao bandido certas benesses que é negado ao cidadão pagador de impostos.